domingo, 27 de setembro de 2009

Determinante, contundente, sagaz

“Ela teimou e enfrentou o mundo se rodopiando ao som dos bandolins.”

Oswaldo Montenegro

Não quero escrever. Não sinto vontade. Aliás, ultimamente, depois de me encontrar na nova fase do jogo, tirei todas as papas que ainda restavam na língua e nos dedos. Desde então, só faço o que e quando sinto vontade. Sabe assim, agora mando eu? Pois é. Na verdade não mando nada, ficou bem provado quando fui obrigada a marcar a data da cirurgia. Eu só obedeço. Mas a Deus tão somente e não a nenhum outro mortal. Não mais.

Então, como não quero escrever, também não quero contar o que se passou naquele consultório segunda-feira, muito menos a noite e, menos ainda, o que eu decidi. Aos fofoqueiros de plantão, minhas sinceras desculpas. Sinto desapontá-los, mas dessa vez reservo-me o direito de contar o que e pra quem quiser. Afinal, agora eu só faço o que quero.

Quem chega na minha idade, com essa bagagem de surpresas, pode se dar o direito que bem entender. Não era pra ter isso tudo, mas como Deus determinou que eu deveria passar por isso tão nova e antes mesmo de parir (ou para não parir), então eu escolho a forma pela qual vou passar por essa fase. E eu escolhi passar bem.

Nada de sentimentos negativos, nem baixo astral. Pelo contrário, todo dia é dia de festa. Pelo menos tem sido. E quando não é festa, ah, aí eu mando logo todo mundo se fuder e fica tudo bem. :-) Ops, escrevi palavrão? :-o Ah, foda-se! O blog é meu, escrevo o que eu quiser. Quem não gostar, que faça o enorme favor de não ler. Pagar de escritor metido a intelectualóide é um barato, mas não sei o quanto de humanismo existe nisso. Talvez nada. E como eu sou bem de carne e osso, meu sangue são essas poucas palavras que ora sinto vontade de registrar.

“Eu não sei fazer poesia...

Mas que se foda!”

Charlie Brown Jr.

Agora melhorou. Essa sou eu. :-D

Não quero e não vou escrever, mesmo. Mas quero que saibam, os passantes, que estou bem e não tenciono não ficar. Agora, exatamente agora, não existe muita coisa que tenha o poder de me entristecer. Não nesse ponto da vida. Agora, haja o que houver, estarei sorrindo, porque é o meu melhor para esse mundo carente de pequenos gestos humanizados.

Porque é isso que eu sou: um ser humano, com amores e dores, mas, acima de tudo, feliz.

Não tardo a voltar, porém, também não sei quando.

L.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Nós nos encontraremos

Incansável, estou assistindo ao vídeo da música This Woman’s Work. Naquela época Maxwell tinha 24 anos. Eu tinha 18. Com 18 anos eu quase fui mãe e cultivava o sonho dourado de ser esposa, dona de casa, cozinhar, lavar, passar e fazer amor todos os dias com A. Igualzinha a toda pré-mulher do século 21. Trabalho, faculdade, dinheiro e independência são doces ilusões as quais nos apegamos, ou melhor, com as quais os outros querem que nos apeguemos a fim de não repetir os mesmos erros de nossas antepassadas. Amor não enche barriga, diziam as mais (sábias) velhas. Mas alguém se importa com isso quando o grande amor da vida mora no edifício ao lado, fala rouco e chama de “minha mulé”, assim mesmo, com o carregamento no final da palavra, pra dar a exata noção de propriedade? Eu não me importava. O que me importava era ter A., meu, meu e meu, nossa casa, meu tanque e o telefone dele. É que não seria um casamento perfeito se ele não tivesse um telefone de onde pudesse conversar com todas as meninas, mulheres e idosas com as quais ele se relacionava. A cabeça nessa época não era lá essas coisas. Não posso me subestimar, sempre me destaquei das demais idiotas da minha idade. Mas o corpo... Ah, o corpo. Fora do lugar não havia nada. Uma mulher mais velha chegara a dizer, certa vez, que com o meu corpo com a sabedoria dela, jamais teria se casado e tido filho. Pensei: mas eu quero tê-los, quero ficar a baranga que for, desde que seja ao lado do A. Aos 18 anos eu não passava de uma cabecinha torta com um corpinho perfeito. E talvez por isso não tenha conseguido me casar com A.: eu era exatamente o que ele queria, mas nunca fui o que eu precisava. Maxwell, após o lançamento do terceiro álbum, em 2001, sumiu. No auge do sucesso, e apesar do disco não ter alcançado o êxito dos anteriores, por algum motivo não revelado, o já consagrado cantor norte-americano isolou-se do mundo. Hoje, aos 36 anos e sete após seu afastamento, ele retorna aos palcos do mundo. Muitos fios de cabelo a menos, talento quase intocado e uma dureza no olhar digno dos que já passaram por longos conflitos internos e externos, mas, melhor da história, conseguiram se reerguer. Do outro lado está sua Pretty Wings. Hoje, aos 29 anos, carrego no ovário direito um cisto que será responsável por um novo capítulo desta caminhada. Ele definirá muitas coisas, especialmente depois que for retirado. Talvez reste apenas a vontade de dar um filho a alguém, lavar, passar e cozinhar. Talvez seja o início de uma árdua luta pra gerar outra vida. Talvez seja o exercício de amor e desprendimento necessário para formar uma vida não saída de mim. São talvezes que me fazem pensar nos 25 anos de Maxwell e sua saída de cena. Nos mesmos 24 anos de A., e o terrível fim do namoro. São talvezes que me dizem claramente que tudo teve seu momento exato de acontecer. E as prováveis respostas são ainda mais claras ao evidenciar que eu não estava pronta pra tantas responsabilidades quando as quis assumir. E muito mais: queria que alguém assumisse comigo. E como uma boa mulher independente do século 21, continuo querendo lavar, cozinhar e assistir ao DVD do Rei Leão numa tarde chuvosa de domingo, chorando como em todas as 27 vezes em que vi sozinha, porém tendo ao lado um ombro amigo, respeitador de minhas lágrimas e incentivador do meu sorriso. Alguém com o mesmo amor pela vida que o meu e que, cansado de buscar satisfação de necessidades efêmeras, carnais e materiais, tenha decidido encontrar positividade até mesmo nesses grandes obstáculos da caminhada. Definitivamente, hoje, eu me casaria com Maxwell. L.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Quando menos é mais

Ficar doente é algo realmente bacana. É quando todos ao seu redor percebem a pessoa frágil que você é, mesmo quando você continua insistindo em bancar a Super Forte, e te carregam no colo, nas costas, fazem um cafuné e a doença propriamente dita, acaba por perder o sentido.

Com todas essas novidades de mioma, cisto e tudo o mais, esqueci de mencionar que nos momentos em que escrevia os posts anteriores, ardia em febre. Não parecia, eu sei.

Autopsicografia

O poeta é um fingidor. Finge tão completamente Que chega a fingir que é dor A dor que deveras sente. E os que lêem o que escreve, Na dor lida sentem bem, Não as duas que ele teve, Mas só a que eles não têm. E assim nas calhas da roda Gira, a entreter a razão, Esse comboio de corda Que se chama o coração.

Fernando Pessoa

Seguindo essa lógica, passei o dia a escrever, pensar, ajustar, enrugar a testa e reler o texto, com nada menos que 38º de febre. As madrugadas foram cruéis, com picos de 39º. E eu lá me importava com isso? Sábado saí, crente que estava com 18 aninhos, cheia de gás pra curtir o baile da Furacão. Hunf! Tá bom... No mesmo pé que fui, voltei. Calafrios me sacudiam o corpo enquanto voltava com o peso dos 29 anos pra casa. Bom, pelo menos deu pra ir ao teatro. A noite foi boa, apesar de tudo.

E o domingo, bom, no domingo ela saiu de casa na hora em que eu cheguei. Antes me deu uma colher de mel. Quando voltou, carregada de todas as frutas que contém vitamina C, outra colher de mel. E peixe. Come laranja! Já comeu a melancia? Agora bebe o suco. De que? Bebe!

Quando fui embora, já bem tarde, ela se preparava pra dormir. Antes que eu terminasse de dizer tchau, ela disse “leva laranja”. :-) E foi assim que passei o dia me enchendo de comida saudável, bebida e um amor materno mais perfeito de todo o universo. Eu sou mimada e sou feliz! :-D

Como não poderia deixar de ser, notícia ruim nunca anda sozinha, só em bando. Logo, estava eu em plena segunda-feira na emergência do hospital, onde passei a tarde toda. Exames de sangue e raio-x depois, a médica fechou a porta pra me dizer o que eu tinha. (Toda vez que alguém fecha a porta pra dizer algo é que vem merda. Ou vem ou já foi. Quando eu fechei a porta pra comunicar ao meu avô que meu namorado queria ir pedir pra namorar comigo em casa, foi pra ocultar a fuga do meliante, que já freqüentava a casa há algum tempo.) Bom, então quando a médica fechou a porta eu esperei pelo pior. Mas na verdade, são piores. Antecipadamente descobri pelo raio-x que as malditas células de Haller continuam no nariz, mas isso é problema pra outro dia. E depois, a infecção nas vias respiratórias e suspeição de influenza H1N1.

(No fundo, eu acho que estou precisando de uma baforada da vovó.)

Saí do hospital zonza, com o atestado de três dias na mão, pra descansar e fazer o exame pra ter certeza. Nos dias de muito cansaço, eu dou meu reino por uma saída duas horas mais cedo do trabalho, mas faltar um dia inteiro não me agrada em nada, que dirá três. E na farmácia descobri que 117,00 pagariam os dois remédios que eu precisava tomar.

Parei na calçada e ri, desolada.

Minha mãe num pânico controlado no telefone, tentando achar solução pra tudo, querendo saber quanto custava o remédio, onde, como, e eu do outro lado lutando pra manter a calma. Se confirmada a doença, sem a minha morte obviamente, eu estava contaminando o balconista da farmácia. Fui ao mercado e prendi a respiração diante da caixa. Meu Deus do céu que mundo louco! Encontrei uma amiga e o filho. Falei de costas. Por recomendação da médica, era melhor evitar o contato com crianças. E isso foi o que machucou com sinceridade. Horas mais cedo, recebi dois pedidos: um pra levar na Bienal do Livro e outro pra dormir lá em casa. Isso quase me fez ceder, lembrar que deveria ficar longe daqueles dois pares de olhos que eu tanto amo nessa vida. Mas não cedi.

Fui pra casa, telefone gritando adoidado. Minha mãe. Já chegou? Ainda? Vem jantar aqui? Por quê? Então dorme aqui. Já tá em casa? E o remédio?

E eu lutando mais que nunca pra ficar calma. A última pessoa nesse mundo que eu queria descontar era ela. Até porque, há uma semana o outro filho tinha tido a mesma gripe, confirmada como não sendo suína. E ela também estava, mas bem mais fraca. Só eu que fiquei muito mal, devido a já ter a porta de entrada pela rinite e a sinusite.

Quando pus os pés em casa, avisei que tinha chegado.

― Vem jantar.

― Não, mãe, vou fazer aqui.

― Vou aí levar laranja.

― Mas eu trouxe ontem, mãe.

― Ah, é. Então...

A ligação caiu.

Enquanto estava me preparando pra fazer a janta, uma mensagem chegou. E outra. “Vem jantar”. “Se quiser, levo aí”. Sorri e desisti. No meu imenso egoísmo, queria ficar sozinha, pensar. Esqueci só poderia se não tivesse alguém me que amasse e se preocupasse comigo. Em pouco tempo estávamos jantando frango ensopado com batata (amo), arroz e salada de soja com agrião.

Quando ela se foi, fiquei na soleira da porta pensando se um dia eu vou sentir esse amor incondicional e tão brutalmente forte por alguém. Como ela iria dormir se não passasse os olhos em mim pra ter certeza de como eu estava? E não havia risco de contágio que a fizesse não ir. Ela ficaria doente comigo e, se pudesse, ficaria no meu lugar. E esse cordão umbilical que nunca se desfaz é outra coisa que só uma mulher é capaz de ter. Isso é amor de mãe. Isso é vida de mãe.

E além disso, como Ele não pode vir em carne e osso, manda seus anjos cuidarem de mim. Obrigada de novo, Ray. Obrigada a todos que ligam, mandam e-mails, MSN e Skype. Até Denise, lá de Goiânia! :-) Amo esse pessoal do Centro-Oeste. Sou feliz por saber que vocês existem. Obrigada, Deus.

E, Senhor, obrigada demais e eternamente por ter me deixado ficar com a mãe que escolhi. Era a certa. É a melhor de todas, com infinita certeza. E quando o meu anjinho do cabelo cacheado me escolher também, permita que eu seja pelo menos metade dessa mãe e mulher maravilhosa que ela é. Amém.

Agora vamos combinar: três dias vendo sessão da tarde é de cortar os pulsos, ainda bem que Deus inventou o livro e a internet. :-D

Volto logo.

L.

domingo, 13 de setembro de 2009

Mulher

Estava pronta para escrever, quando senti alguma coisa mexer em meu pé direito. Levei um susto, parecia uma barata. Baixei os olhos e dei de cara com uma borboleta azul, tão assustada quanto eu, se segurando no peito do meu pé. E neste exato minuto, as 10:57 do dia 13 de setembro de 2009, ela está relaxadamente pousada sobre o travesseiro que era meu.

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Pensamentos borbulham em mim. As idéias me fervem como água de vulcão. A semana foi de intensos momentos a sós com Deus e apenas comigo, refletindo, analisando, reinventando as maneiras de encarar a vida.

Você só descobre que é forte, quando algo testa sua coragem. Só entende que mudou, quando se vê diante da mesma situação que o obrigava a agir de maneira errada e você escolhe fazer diferente. Sem o teste não há certeza.

Sendo eu uma profissional que lida a maior parte do tempo com outros profissionais da área de saúde, tenho acesso a informações que o resto dos mortais não tem. Sei, por exemplo, que o medo e a vergonha são as principais causas de mortes e retirada de órgãos em mulheres, devido a doenças sexualmente transmissíveis ou cancerígenas. Foram estes sentimentos que eu evitei quando a médica noticiou o mioma e cisto uterinos em mim. Virei o rosto pro lado e pensei. Não veio lágrima, nem auto-piedade, nem nada. Só fiquei lá imaginando aquela bolota de 6cm na região posterior do útero. Enquanto eu estava virada, não satisfeita, a médica ainda achou um cisto (outro!) de 5cm. Ok, pensei comigo, se Ele está me mandando mais essa, é porque sabe que eu sou capaz de aguentar.

Cistos são tumores benignos, o que significa que não evoluem para o câncer. Mas oferecem toda sorte de transtornos, como dor, inchaço nos pés, na barriga, etc e, affmaria, etc. O cisto pode criar dificuldade pra engravidar, ou, dependendo do local em que esteja, pode deixar uma mulher estéril, caso precise retirar os ovários por conta dele. Engraçado como nada disso me assusta agora... Acho que por ver tantas mulheres sofrendo com essas contrariedades inerentes ao sexo feminino, me acostumei a não me chocar, nem ter medo. E não tenho mesmo. Sempre fui sabidamente um caso do grupo de risco. Com isto eu também lido todos os dias no trabalho: os grupos de risco. Obesos, fumantes, sedentários e pessoas com histórico familiar, são propensos a hipertensão, diabetes, câncer, etc e etc. E eu faço parte do grupo do histórico. Câncer, mioma e cisto já causaram alguns sustos em algumas de nós. Mesmo assim, continuo não tendo medo. Elas, que enfrentaram a quimioterapia, a radioterapia, que tiveram retiradas de si partes de seus corpos, não tiveram. E são mulheres fortes, sábias, meus anjos da guarda na terra. São pessoas as quais me orgulho demais de carregar o mesmo sangue, a despeito de qualquer coisa que venha com ele. E se elas não tiveram medo, eu tampouco terei.

Quanto a vergonha, bem, essa eu nunca tive mesmo. Então, tratar de saúde comigo, sem problema, vamos sentar e conversar a respeito. Aliás, na minha nova família que virá, falaremos disso na sala, como falaremos do último capítulo da novela e do melhor livro de Fernando Sabino.

E quanto aos idiotas (geralmente homens) que sempre acham que no dos outros é refresco (já começou no Orkut, um Super Idiota me dizendo que não conhece nenhuma mulher que tenha tido câncer de útero e mama), segue um breve relato sobre estes tumores:

Miomas são os tumores benignos (não cancerosos) mais comuns do trato genital feminino. Eles também são conhecidos como fibromas, fibromiomas ou leiomiomas. Se desenvolvem na parede muscular do útero. Embora nem sempre causem sintomas, seu tamanho e localização podem causar problemas em algumas mulheres, como por exemplo, sangramento ginecológico importante e dor em baixo ventre.

Fontes: Centro de Tratamento de Miomas e Boa Saúde

Não estar com medo, não significa que eu esteja contente e normal. Na verdade, estou tensa com o pós-operatório, ficar longe do trabalho, faculdade na reta final... enfim, isso me preocupa de verdade. Mas esse não é o momento pra ataques de perereca, pelo contrário, quanto mais tranquilidade, mais fácil e rápido acharei as soluções pra todas essas questões. Esse é aquele exato momento em que eu digo a todos que também sei ser egoísta, paro de bancar a protetora dos fracos e oprimidos e vou olhar apenas pra mim. Sem cerimônia e sem medo de ser feliz. É o momento em que eu me basto. Mentira, não sei se vou aguentar ficar sem colocar algum desamparado nas costas e levar até a outra margem do rio. É meu, sou assim, apesar de querer muito, não consigo ser diferente.

Reze a Deus para que você possa lutar.

Eu fico esperando do lado de fora do trabalho dessa mulher,

Do mundo dessa mulher.

Ooh, é difícil para o homem, Agora sua parte chegou ao fim. Agora começa o ensinamento do pai. Eu sei que você tem um pouquinho de vida em você ainda. Eu sei que você tem muita força. Eu sei que você tem um pouquinho de vida em você ainda. Eu sei que você tem muita força. Eu deveria estar chorando, mas eu não posso deixar isso aparecer. Eu deveria estar esperando, mas não paro de pensar De todas as coisas que nós deveríamos ter dito, Que nos nunca dissemos. Todas as coisas que nós deveríamos ter feito, Que nunca fizemos. Todas as coisas que eu deveria ter dado, Mas não dei. Oh, querido, faça isso passar, Faça ir embora. Dê-me aqueles momentos de volta. Dê-me os de volta para mim. Dê-me aquele beijinho. Dê-me a sua mão. Eu sei que você tem um pouquinho de vida em você ainda. Eu sei que você tem muita força. Eu sei que você tem um pouquinho de vida em você ainda. Eu sei que você tem muita força. Eu deveria estar chorando, mas eu não posso deixar isso aparecer. Eu deveria estar acreditando, mas não paro de pensar De todas as coisas que eu deveria ter dito, Que eu nunca disse. Todas as coisas que nós deveríamos ter feito, Que nunca fizemos. Todas as coisas que você precisou de mim. Todas as coisas que você quis de mim. Todas as coisas que eu deveria ter dado, Mas não dei. Oh, querido, faça isso ir embora, Faça ir embora agora.

Engana-se quem acha que a pior parte é enfrentar o meu problema de saúde. O pior agora vai ser conter o meu desejo de fazer campanha pelo mundo a respeito das doenças femininas que podem levar a morte. Sempre falei, mandei e-mails, alertei da forma que tinha e podia, mas agora uma força estranha toma conta de mim, uma vontade de fazer um alerta em praça pública, pedir a esse governo sujo que disponibilize ultras-transvaginais para a população de baixa renda, sem acesso a plano de saúde. Dá vontade de sair gritando por aí SE CUIDEM ANTES QUE SEJA TARDE!

Minhas duas bisavós maternas faleceram de idade, aos 94 anos. Uma delas eu conheci. Vidinha humilde lá no interior do Ceará, sequer sabiam que suas descendentes se veriam as voltas com máquinas, aparelhos, remédios, tubos e tantas dificuldades pra manter a chama da vida acesa. Mas certamente deviam ter certeza que traríamos no sangue índio, a perseverança e a coragem de quem nunca foge de uma boa batalha.

Nada temo, pois tenho um maravilhoso Deus de amor do meu lado.

*-*-*

[16:23:34] TT: mais uma vez... muito obrigado por me dar a honra por me aproximar de você e hoje ser uma pessoa importante para mim...

[16:23:47] TT: vc é extraordinariamente maravilhosa........

Eu que agradeço por poder participar dessa caminhada do teu lado. Eu não seria uma pessoa melhor sem sua vida.

*-*-*

Aquela borboleta veio me dizer alguma coisa, o que será?

Agora, se vocês me dão licença, tenho uma vida pra viver, trabalho a fazer e uvas passar a comer.

Maravilhosa semana pra todos!

L.

Serve suco de laranja?

É muito comum mudar o canal da televisão e se deparar com programas sensacionalistas nos quais mulheres agredidas moral e fisicamente por seus parceiros, choram pitangas que, depois, se transformam em suco. Claro, elas sempre voltam pra eles, se não voltassem, não seriam agredidas tantas e tantas vezes, afinal, nunca se vê alguém dizer “foi a primeira vez que ele fez isso”. Nunca é. O silencio leva a reincidência, que leva ao costume, que termina com o descrédito total ao choro das pitangas de mulheres agredidas. E nós, mulheres do século 21, criadas para sermos independentes, votamos, cozinhamos por gostar, trabalhamos por vontade, estudamos para sermos melhores do que foram nossas mães e avós, mas ainda nos deixamos abusar por homens como foram nossas bisavós, subjugadas por seus maridos.

Hoje, nós mesmos nos maltratamos, violamos e damos a eles apenas o crédito pelo não uso de camisinha, pelo fato de nunca termos certeza do fim do relacionamento, e, por mais que qualquer outra coisa, por não nos bastarmos.

É especialmente fácil dizer que o sujeito não presta e não olhar para o próprio umbigo. No primeiro mês de namoro ele invade seu computador via internet, num ataque hacker, e, tomado pela síndrome do Eu Sou Mais Esperto, rouba seus históricos do MSN, fotos, textos e tudo o mais que puder. Em seguida você faz o que? Chora, se descabela, descabela a ele, vocês caem na porrada e na semana seguinte, se amam como no filme Lagoa Azul. No quarto mês, você tem a pior Páscoa da sua vida, termina o namoro ao dormir no chão do quarto dele, vai embora magoada com as mentiras dele, chega em casa e ele te pede pra voltar, você amolece e quando está pronta pra dizer sim, ele some da internet e vai ao cinema com outra. Você, claro, chora e depois perdoa, volta e quando menos espera, está tomando uma gravata e desmaiando no chão da sala dele. E chora, perdoa e volta. Quando pensa que não, está sendo sufocada no colchão dele, sacudida, jogada no sofá, machucada de todas as formas, inclusive e principalmente, está sendo violentada moral e psicologicamente. E, ciclicamente, chora, perdoa e volta. A sua volta, todos acreditam que ele seja um santo, afinal, ele se comporta como um, tão manso, tão gentil e amigo. Porém, mais do que o comportamento dele, é o seu que determina a santidade dele: você briga, fala alto e gesticula, e, pior que tudo, sempre volta pra ele. Ainda que ele não seja santo, você está bem longe de algo parecido. Ele carrega a marca de um arranhão seu na mão esquerda. Todos podem ver o quanto você é agressiva. E ele carrega fotos suas, nua e na cama com o ex-namorado, e a cada briga ameaça-a de revelar ao mundo essa intimidade maravilhosa, da época em que ainda nem sonhava em conhecê-lo. E essa agressividade dele ninguém pode ver. Apesar disso, você sempre chora, perdoa e volta. Sua família, seus amigos, todos a sua volta o vêem como coitado em suas mãos, e você, a carrasca do pobrezinho. Ah, se pudessem imaginar que você entrega dinheiro a ele para o pagamento das contas e ele desaparece e não devolve mais, se sonhassem que ele inventa assaltos todos os dias, ou perdas misteriosas do dinheiro dele para usar apenas o seu, que dorme, come, e tem lindos sonhos as suas expensas, talvez aí sim, lhe dessem algum crédito pelo sofrimento não revelado. Você já quis contar que foi com o seu dinheiro que ele pagou colégio da filha, comprou roupa e comida pra ela, que saiu para se divertir sozinho e com a filha, mas desistiu, afinal, você chorou, perdoou e voltou.

Um dia, por vontade própria, ele se vai. E você chora, chora, chora mais, não perdoa e nem volta. Não pode voltar. Ele tem outra e não quer mais você. E você apenas chora.

Lá vai você, sorridente ao lado do novo namorado, aquele que respeita seus limites, que a faz morar eternamente no céu cada vez que lhe beija o pescoço, que a deseja em palavras e gestos, que a toma por sua e se impõe diante dos outros. Com ele não há choro, muito menos perdão e tampouco volta. Só há aceleração, vento no rosto, estrada sem fim. Quando a sexta-feira chega, vocês vão para aquele lugar feio, onde o som é pesado, e no qual você corre o risco de encontrar pessoas indesejáveis. Você e o namorado no mesmo local onde freqüenta o ex que te abandonou. Mesmo assim você aproveita ao máximo sua noite e finaliza o espetáculo em três belíssimos atos. Ah, como é bom amar assim, você pensa extasiada e envolta nos braços fortes que não te machucam, apenas protegem.

Porém, apesar do momento ímpar de felicidade, tão madura e redonda, algo em você ainda não está resolvido. Você então diz a ele que não consegue, não pode, não dá e mais mil frases batidas pra explicar que é incapaz de amá-lo como ele merece. Ato contínuo, reencontra aquele que veste a pele do cordeiro, e, feliz da vida, daquele seu estranho modo de achar felicidade nas coisas, termina o que faltava: perdoa e volta.

Como não poderia deixar de ser, ele volta com algumas surpresas recém-adquiridas com a ex (sim, ela agora é ex porque, ao contrário de você não o aturou muito tempo e o dispensou antes de enlouquecer), mas você finge não notar. Ele te pergunta se você teve outro homem, você diz que sim e ele se transforma outra vez, igualzinho antigamente, perde a calma, grita, bufa e joga na sua cara que no período de separação ele apenas ficou mas não teve coragem de ir pra cama com outra. Ele diz olhando nos seus olhos, não, ele grita que a moça implorou pra ser penetrada, mas ele foi forte e fiel ao seu amor e não consumou o ato sexual com ela. Ele te faz sentir vergonha, te faz se sentir suja e indigna do amor dele. Você chora, ele te perdoa e você volta.

O mundo é pequeno e você descobre-se ouvindo as verdades. Ele não só havia ido pra cama com a tal moça de vida fácil, como havia engravidado-a, e ela havia abortado o bebê. Você descobre, petrificada, aterrorizada, mortificada, que ela não era apenas uma vagabunda, era vagabunda do mesmo centro de candomblé que ele freqüentava, quando dizia pra você que precisava cultuar o orixá e a deixava em casa sozinha. E a voz do outro lado ainda te diz que o único orixá que ele cultua é o da filhadaputagem, pois já vinha cantando-a desde quando ainda era seu namorado. Você pergunta por que, e a voz lhe diz que irmãos de santo não podem ter caso, muito menos trepar, é como um incesto, desta forma você não foi a única enganada, mas também o coitado do pai-de-santo da casa que, como você, abriu as portas, cuidou, amou e foi traído da mesma maneira repugnante.

Aí você pensa, analisa, pondera consigo mesma e conclui que não há mais o que chorar, apenas perdoar e voltar. Você volta e convive outra vez com todas as deformidades da alma dele. E se ajuda, tenta ajudá-lo também, mas ele parece não querer. Ele te empurra, cospe em você, te sacode pelos ombros, te joga no sofá, tudo igualzinho. A diferença é que dessa vez você não revida e nem sente pena de si. Começa então a entender que deve sentir pena dele, que anda na contramão da sua evolução. E você não tem mais gritos pra ele agora. Não tem mais unhas, nem desejos demoníacos de vingança. Você se pergunta se o amor acabou. E se responde.

Num ataque suicida, tomado por um ciúme doentio, animalescamente ele invade computadores via internet, invade MSN, Orkut e contas de e-mail, as suas e dos seus amigos mais chegados, aqueles que ele sabe que você confidencia sua vida. E, saciado, descobre que você mentiu, que não vale nada, que é uma grande canalha. Ele passa a te tratar mal, vivendo com aquele ódio cancerígeno no peito, amargando noites, sangrando dias. Cansada de fingir para si mesma, você termina com ele, assim, em paz e em tom baixo. Ele explode, te acusa, te ameaça de morte, tenta quebrar sua casa, tenta te machucar mais uma vez. Ele berra enfurecido, enquanto você vê o brilho da morte nos olhos dele, enquanto te acusa de mentir por não contar que ficou com outras pessoas enquanto vocês estavam separados. Você quer rir de nervoso, mas teme que aquele pedaço de madeira nas mãos dele vá parar na sua cabeça e se mantém firme. Como uma professora que lida com um aluno menor e violento, você o leva a crer que se afastar é o melhor naquele momento e ele se acalma e vai embora. Mais uma vez com o seu dinheiro. Quando você o chama de volta, para conversar, porque gosta da companhia dele e acha que há possibilidade de reversão do quadro, ele vai com todas as facas e espadas em punho. Você pede para dormirem e conversarem de manhã, ele a acusa de fazê-lo de idiota. Ele grita, acorda o filho do vizinho. Ele se transforma, parece uma cascavel pronta pra dar o bote, mais ameaças, mais gritos e você, amedrontada. Você pensa, se eu morrer aqui sozinha, ele vai fugir e ninguém vai me acudir. Ele pensa, é isso aí. Ele dorme, mas seu medo não. Mas você ainda tem uma coisa importante: a inteligência emocional. Quando ele finalmente se vai, você se perde em pensamentos enquanto sente as pernas bambearem.

Agora não há mais o que temer. Você tem paciência e espírito para decidir o melhor a fazer. E você faz.

Quando você se respondeu que não havia mais amor, esqueceu-se de dizer que não havia mais piedade também. Nem vinganças baratas. E neste dia novo, pela primeira vez em quase três anos, você não chora, não perdoa e não volta. É o dia em que você compreende e aceita, definitivamente, que não pode mais culpar a ele por seu ciclo de fraqueza. Se você sabe que o sujeito não presta, a culpa é sua se continuar a história. Quem é cúmplice é tão culpado quanto quem comete o crime. Desde o início o erro foi seu, o erro é seu. E se não quiser que seja mais, comece por mudar a sua atitude, a sua postura diante dos fatos. Se não quer continuar passando como a deprimente mocinha que se auto-flagela enquanto o amado leva vida de rei. Se não pode mudar o mundo de uma vez, comece aos poucos, por você. Faça sua parte e você verá como os seus olhos enxergarão além das fronteiras das possibilidades criadas por seu coração.

Porque nossas bisavós, pelo menos, morriam apenas de velhice.

L.