quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Em nome do Pai

Saí pra almoçar, louca de fome de um livro que me pregasse os olhos. Entrei na livraria que abriu, providencialmente, no prédio do meu trabalho e pus-me a procurar aquele que seria O Livro. Após sair de um Sidney Sheldon novinho, o que viesse teria que ser algo perto de perfeito. Procurei, busquei, me encantei com novidades de velhos autores, fiquei curiosa com antigos de autores novatos e me dei por vencida: não havia nada que saciasse minha fome. Andando pelo Largo da Carioca, me lembrei. Parei na próxima loja, entre a sapataria e a de roupas. Ainda sem poder caminhar rápido devido ao processo pós-operatório, segui firme pela loja até encontrar o que queria. Lá estava ele, com capa bem simples, folhas finas, letras miúdas. Havia até um mapa. Segurei-o como que fosse um tesouro. Agora sim, havia acabado a fome, a sede e a dor não tardaria a passar também. Busquei em tantos lugares, tantos nomes e esqueci que o livro mais importante de todos, apesar de já ter lido, não estava mais do meu lado. Agora está, a Palavra de Deus, no coração e na cabeceira.

L.

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Momentos em foco

Voltei com a corda toda pra escrever e assim o fiz. Mas algumas imagens do último trimestre foram mais importante do que tudo que deixei de dizer. Ei-las:
O lugar onde eu aconteço e faço o que amo. Galera de Goiânia em treinamento comigo.
Em ação!
Na farra: com meu ritmista preferido, Helton. É Surdo Um, ô Mané!
Porque só as Tias são felizes...
E assim tudo fica maravilhoso!
A luz, o amor e a fé em dias melhores.
Começando a reformar a casa. Momentos antes da cirurgia e eu modelando...
E a minha leoa protegendo meu derrièrre. Eita colo gostoso!
De volta: tudo perfeito e devidamente no lugar. Obrigada, Pai!
Logo depois, remédio que cura a alma.
O amor.
Gente levada, fazendo farra na minha recuperação. E eu...
... juntinho! hehehe Só as madrinhas se divertem até na dor.
Concurso de caretas em pleno Reveillon.. Uma das melhores.
Gangsta, mano!
Poderia não estar assim e não ter sido tão bom. Cercada de amor e carinho, isso é o que verdadeiramente importa.
L.

sábado, 23 de janeiro de 2010

Filé de peixe: limpo e fresco

Tudo começando a ficar bem.

Interessante como os valores mudam diariamente. Ou melhor, acho que valores de uma vida são na verdade sazonais. As prioridades dos meus vinte anos foram-se quando fiz trinta. Sim, já os fiz. Cronologicamente ainda faltam alguns meses, mas aqui dentro, do peito e da mente, a idade da mulher madura instalou-se bem aos poucos, quase que sorrateiramente. Quando vi, nada mais era o mesmo ou estava no mesmo lugar.

Hoje tenho a certeza de que mudanças, sejam de que ordem for, jamais são definitivas. Assim como os amores não são eternos. Hoje sei que basta uma palavra para alterar o curso de toda uma vida. E basta uma fagulha de egoísmo para dar de comer aos lobos. Em todo o caminho há falsas ou fracas amizades. E a falsidade que outrora me despertava a ira, agora me entristece. E a tristeza não acompanha a raiva, pelo contrário. A tristeza enfraquece a saudade. E como não existe nada que alimente uma saudade, o amor morre.

Amor de verdade não morre. Se morrer, é porque nunca foi forte. E fraqueza, e isto é uma certeza, não pode fazer parte da minha vida.

Nem fraqueza, nem egoísmo. E muito menos falsidade.

Vejo de longe, bem distante mesmo, palmas e gargalhadas de quem acha que basta a própria vida para que o outro seja feliz. Sinto pena. Pessoas medíocres agem assim, como quem nada quer, usando a máscara sorridente para afastar os que incomodam.

E eu bato. Bato forte e pra doer de verdade. De frente e sem medo nem vergonha. Aliás, quando bato é porque acho que ainda vale à pena. O meu silêncio é o tiro de misericórdia.

Covardia nunca foi o meu forte. Cravar o punhal nas costas nunca foi divertido. Na testa, sim. Portanto, quando algo me incomoda, aprendi a dizer, verbalizar, oralizar sentimentos, sejam positivos ou negativos. Especialmente os negativos. Aprendi a usar palavras para o fim a que se destinam. E quando algo de fato me aborrece, não me escondo, nem saio de fininho e nem enveneno os outros a minha volta. Pelo contrário, dignamente deixo claro e só então me retiro. Porque covardia, repetência proposital, nunca foi o meu forte.

E mulheres de trinta não discutem com meninas de vinte. Mulheres sorriem, e meninas, bom, isso eu não me lembro mais. Acho que no meu tempo de loura-burra eu devia ser assim também, o que é absolutamente perdoável. Nascemos idiotas e morremos idiotas, o que nos salva é o que fazemos no intervalo. E até a hora da idiotice derradeira, quero estar aqui, analisando tudo quanto me for possível, correndo, amando, fazendo filhos, lendo livros e plantando árvores.

Aí, elas virão dizer “A Lucille se acha.” Passei dessa fase, queridas. Eu me tenho certeza, mesmo. Com essa cabeça e o corpinho dos dezoito, teria feito muito mais estrago por onde passei, de proporções mundiais. Ah, a Itália... Enfim, acho que é algo que passa pela cabeça de todas quando percebem que, se a bundinha não é mais a mesma, é hora de se tornar uma pessoa legal.

Mas eu sempre disse que pessoas legais, daquelas que todo mundo a-do-ra a primeira vista, que é sempre solícita, sorri pra tudo, nada a desagrada, concorda com todos, certamente são pessoas do tipo que eu detesto e do qual nunca serei. Não sou legal. A grande vantagem da maturidade é saber em que momento bancar a legal. E isso, sem modéstia, eu faço muito bem.

Há uma diferença sutil em ser falsa e bancar a legal. A falsa é aquela que diz pra amiga que não sabe de nada, mesmo tendo consciência do que fez de errado. A pessoa que banca a legal, fica quieta a espera do pedido de desculpas, mesmo sabendo que ele não virá e jamais, jamais mesmo, desata o nó que prende as barbaridades insensíveis que gostaria de dizer para alguém que não conhece, a fim de não magoar uma terceira pessoa.

E enquanto oficialmente ainda sou uma menina de vinte, delicio-me com a bundinha ainda no lugar e a mente em constante evolução. Porque só as balzaquianas conhecem verdadeiramente o sentido da palavra equilíbrio.

Não há dor que o sono não consiga vencer.

Estamos habituados a julgar os outros por nós próprios, e se os absolvemos complacentemente dos nossos defeitos, condenamo-los com severidade por não terem as nossas qualidades.

É tão natural destruir o que não se pode possuir, negar o que não se compreende, insultar o que se inveja.

Honoré de Balzac

ઇઉ ˙·٠.ઇઉ

- Lucille, você me permite uma ousadia?

- ... Sim.

- Você fica muito bem de vestido. Não que não fique com outras vestimentas, mas o vestido realça sua beleza.

- Você tá diferente.

- Diferente somo?

- Não sei... mais séria, mais madura, mais calma.

Quando você recebe esse tipo de comentário, vindo de um Gestor do Jurídico ou vindo de um amigo que não vê há dois anos, descobre que está exatamente onde queria.

ઇઉ ˙·٠.ઇઉ

Deus dá o peixe. Aprender a pescar depende de você.

L.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

O coração cura o corpo - parte 4

Na feliz manhã seguinte, com o vestido florido e os cachos soltos, parti para casa. Deixei atrás de mim enfermeiros e técnicos, recepcionistas e médicos que fizeram diferença nesse processo de recuperação. O hospital em si era feio. Apesar de ter garantida uma boa vida com o plano de saúde, a equipe médica decidiu por operar lá, em função do centro cirúrgico ser bom, tanto quanto hospitais luxuosos e devido a outra paciente não ter plano de saúde. E o que eu poderia exigir diante da única possibilidade que tinha? Um hospital-hotel 5 estrelas não faria muita diferença no final, eu precisava era ficar bem.

E fiquei. E estou. Quase 30 dias após aquele 22 de dezembro, ainda sinto algumas dores na barriga, mas a cicatriz está bem bonita, tanto quanto poderia ficar uma cicatriz de micro-cesarea. Não deu tempo de avisar a todos, nem mesmo de me organizar completamente. Avisei a quem pude, aproveitando a lista de e-mails já pronta no trabalho, e alguns amigos passaram a informação pra frente.

Hoje, já saindo pra dançar, comendo uva passa (dietinha miserável!) e bebendo, estou quase bem de verdade e muito mais consciente da importância das pessoas em minha vida. Os amigos foram a força que faltava nesse momento, especialmente quando eu precisava fugir da minha própria dor. Prestes a subir na maca, recebi a mensagem “Me dê notícias, por favor!” rs. Não deu tempo de responder, mas foi uma das primeiras coisas que fiz quando voltei. Fiquei muito feliz de ter sido acompanhada, mesmo não querendo ser. E eu só posso agradecer infinitamente a Deus por tudo isso.

Deus, sem dúvida alguma, foi sensacional. Deu o problema, mostrou a solução e esteve comigo o tempo todo enquanto eu resolvia. Maravilhoso Pai, sem ti eu nada seria.

Luzia, a minha leoa favorita, a mais guerreira, mais bonita, mais forte e perfeita de todas as amigas. Obrigada por... sei lá, tudo. E mais um pouco. Michel, quase me fez arrebentar os pontos, me fez derramar a única lágrima do período e isso tudo de tanto rir. Só falta um ano! E apesar de tudo, obrigada por me aturar, incansavelmente chata. Jones, Nadir, Marquinho, Marlene, Marco, Salete, Leila, Célia, Simone, Thaís, Diogo, amigos, desrespeitando a minha recomendação de não me ligar, fizeram o que eu precisava: saber que vocês estavam lá. Obrigada pelo carinho e amizade.

Bebês, ter vocês do lado me lembrando horário de remédio e “cuidando” de mim, impossível querer outra vida. Campeonato de caretas? hahaha Obrigada por me fazerem a madrinha mais feliz e um ser humano melhor todos os dias.

Família, caramba, gente pra chuchu... Fofoca rolando no quarto e eu sem poder falar e muito menos rir. Então para eu não rir. Ceia de Natal que eu não podia comer, então faz separado, sem tempero pra mim. Água, remédio, jornal, revista, fruta, carinho, cuidado, atenção. Mimada volume máximo! Obrigada a todos pelo cuidado.

Hoje sei que sem tudo isso, sem a certeza no coração de estar cercada por tanto amor e carinho, o corpo não teria reagido tão bem. Amo todos vocês.

Levei tanto tempo para registrar, pois não podia ficar muito tempo sentada. Agora que já fui dançar, posso quase tudo. E esse quase que é o problema. rs

Voltando ao blog e a vida com força total, louca para que aconteçam as mudanças de 2010, já engatilhadas. Feliz com o rumo da vida, penso que um ano de espera é o tempo ideal para amadurecer o que ainda não está completamente pronto.

E o que ainda não está bom, há de ficar.

L.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

O coração cura o corpo - parte 3

Fiquei aguardando no corredor, ao lado da entrada da sala, enquanto a paciente anterior era finalizada. Da mesma idade e com nada menos que sete miomas, a operação dela levou muito mais tempo do que o previsto, quase quatro horas. Pensei nela também. Será que já seria mãe? Ou será que estava se dando a esse penoso trabalho pelo mesmo motivo que eu? Deitada ali, vendo e ouvindo o mundo se movimentar, conversei com Deus enquanto esperava a que seria a hora mais importante. Analisei a caminhada, e me orgulhei de muito mais coisas do que me arrependi. Aliás, arrependimento verdadeiro, apenas um...

Fui retirada das divagações com o solavanco da maca entrando na sala de cirurgia. Aquele azul claro bonito dava a impressão de que haveria tudo ali, menos uma miomectomia. Especialmente em mim. O tratamento da anestesiologista Dra. Gisella só contribuiu para que eu fosse a melhor paciente do hospital. A cada passo eu era avisada sobre o que estava acontecendo. Tensa, me mantive em silêncio, absorvendo tudo com o olhar e coração. Sabendo previamente que aquela mulher seria a peça chave da cirurgia e que, friamente falando, minha vida estaria nas mãos dela, vi que estávamos então no momento crítico quando ela me mandou virar de lado, encostar queixo no peito e joelho na cabeça. Obediente, me coloquei em posição fetal, rezando pelo momento de dormir e não sentir nem ver mais nada. A primeira agulhada. A segunda com mais vontade. A terceira e... “vira rápido!” Quando me pus de volta a posição inicial, as pernas já não eram mais minhas e em mais outros segundos, nem os quadris me pertenciam mais. Vi que me levantaram, dobraram e eu sequer podia sentir. Lutei muito para me comportar, como me recomendou minha mãe e por saber que a minha luta seria recompensada com menos tempo ali e a garantia de sucesso.

Finalmente, olhei para as luzes acima de mim e elas começaram a se mover. Pisquei e olhei de novo, as luzes estavam agora dançando. E em seguida, tudo virou nada.

Lá embaixo, a leoa andava de um lado para outro do quarto. Lia, cochilava, via TV. Rezava e pensava. Muito mais tensa do que parecia, ela não via a hora de ver sua cria de volta e ter certeza de que estava tudo bem.

Levou mais ou menos dois segundos? Talvez. Vi todos saindo da sala e eu ficando. Acabou?, perguntei ainda sonolenta e sem noção do meu corpo. Havia acabado e tudo tinha corrido perfeitamente bem. Mas, psiu, não podia falar ainda. Em uma hora e meia, não só meu corpo havia sido mexido, como minha cabeça e valores. Apesar de lúcida e consciente, existem lacunas no tempo entre a volta pro quarto e o final do dia vitorioso. Eu estava de volta e melhor.

De volta ao quarto, segundo me contaram, entrei com os olhos buscando algo. Alguém. Alívio ao vê-la ali, em mostrar que sim, eu estava bem. Novamente um hiato. Um cansaço descomunal, uma fome maior ainda. Não podia falar, mas queria muito. Não vi o mioma, mas quem viu disse que era uma laranja marrom. A barriga, estranhamente, doía a cada respiração. O fim da anestesia, que deveria ter sido uma tragédia, com dor e coceira, foi nada menos que um leve incomodo na ponta do nariz. Outra vitória.

Com a recomendação médica de levantar após seis horas e já me sentindo ótima, sem anestesia e sem fome, forte e bela, apenas com a dor na barriga, resolvi sair da cama. Antes dos primeiros raios de Sol do novo dia e já sem sonda, levantei da cama e, não tendo resposta as minhas chamadas do meu acompanhante desmaiado, segui pé ante pé para o banheiro. Segui meio cambaleante e meio firme, porém, na porta senti alguma coisa errada. Entrei e vi o banheiro rodar. Alguma coisa estava muito errada. Sentei no vaso e respirei bem fundo, mas aquele cheiro insuportável de desinfetante de banheiro não ajudou muito. Voltei para o quarto, vencendo os invisíveis obstáculos a minha frente, temendo uma queda. Consegui alcançar a cama, deitei e fiquei bem quieta, tentando recuperar o ritmo normal da respiração e para que passasse a ânsia de vômito intensa. Dormi outra vez e acordei para o café logo depois. Café e banho! Nunca gostei tanto da ideia. Mas novamente fui traída pela pressão. Depois do banho precariamente de pé, como um Homo sapiens, vi novamente o mundo jogar como um navio em tempestade e desta vez o impulso gástrico foi mais forte e quando me dei conta, já não havia mais café da manhã no estômago. Ficou apenas a dor pela contração dos músculos abominais, que pareciam terem sido os verdadeiros operados.

Decidi ficar preguiçando na cama, para não correr o risco de outra queda de pressão. Péssima ideia que me custou caro. Não tive alta devido a preguiça no funcionamento do intestino. Correndo o risco de ter de passar o Natal internada, vi-me como Rocky Balboa, teria de lutar e treinar pesado para chegar onde queria: minha casa. Com a música na cabeça, deixei minha mãe me “vestir” com o lençol a fim de cobrir o que a fina bata aberta nas costas deixava a mostra, e, de braços dados, lá fomos nós corredor a fora. O objetivo maior? Fazer cocô para carimbar o passaporte de volta pra casa e passar o Natal em família.

Quando cheguei ao final do corredor, o suor frio me assaltou. A médica que acompanhou o grande progresso perguntou se estava tudo bem. Estar, não estava, mas correndo o risco de passar o Natal ali, balancei a cabeça afirmativamente: tudo estava ótimo. A cada passo eu mentalizava a reação do meu corpo, agarrada ao braço da minha mãe, caminhava rumo a minha libertação. E deu certo. Com mais uma caminhada em menos de quatro horas, tudo estava resolvido e no seu devido lugar. Bom, não completamente, mas a volta estava garantida e em casa eu me acertaria com o senhor intestino que, definitivamente, estava disposto a dificultar as coisas.

O que ele não sabia é que em matéria de teimosia, eu sempre fui mais eu. Agora mais que nunca, concentrada em teimar em ficar boa logo.

Continua...