Em
algum momento do futuro, hei de querer me lembrar desses dias e sei que a
memória apenas não me facilitará desencavar tantos sentimentos, tantas
situações, sorrisos e principalmente lágrimas. A verdade é que não tenho
certeza se quero me lembrar.
A
primeira ruptura de laços se deu quando eu troquei minha zona de conforto da
vida inteira, por uma vida a dois, a qual eu acreditava que tinha 50% de chance
de dar certo ou errado. Quis me enganar a todo custo e caí na minha própria
fantasia: só havia um número percentual e esse era 100 ― para dar errado.
Numa
terça-feira, ouvi que se não pudéssemos ter filhos, adotaríamos. No dia
seguinte, ouvi que um filho seria um estorvo, motivo de frustração e
infelicidade. Ele queria fazer um filme, eu queria fazer uma família. Saí da
minha casa com a mala lotada de expectativas positivas, os grandes sonhos na
eminência de realização. No momento em que ouvi aquelas palavras, foi como se
adagas cruzassem cada parte do meu coração. “Seu sonho não cabe no meu.”
E
essa foi a segunda ruptura: a jovem esposa que cuidava do lar e do marido, pronta
para ser mãe, abriu a mala, jogou dentro o pouco de dignidade que ainda lhe
restava e foi embora daquela casa, aos prantos, assustada, magoada e
arrependida.
E
eu morri outra vez.
As
semanas seguintes foram cruéis. Um pedaço de mim queria ir embora, mas só um
pedaço, pois grande parte queria acordar do pesadelo e voltar a vida com
sonhos, promessas e dedicação ― ainda que fosse unilateral. Ao se
completar a terceira semana, veio o ultimato: mais 5 dias para desaparecer.
Como? Para onde? Isso não importava. No auge do sofrimento, ainda fui acusada
de estar fingindo uma dor para me lançar aos braços de outro. Seria
perfeitamente possível, mas não tinha como acontecer: só havia dor e mais dor,
nenhum espaço para aventuras.
A
terceira ruptura foi trabalhada na urgência: ou você foge ou morre. Psicopatia
não manda recado, minha vida estava constantemente em risco e eu não tinha
muito tempo. Pus tudo que me pertencia no carro e fui para longe. Longe de
tudo, de todos, dele e dos sonhos.
Quando
entendeu que seu pedido-ordem estava se realizando, me pediu para ficar. Eu não
podia ficar: já tinha ido embora há muito tempo, só meu corpo é que havia
ficado. E essa foi a ruptura menos dolorosa, a quarta. Não houve dificuldade,
pois a alegria de olhá-lo nos olhos, do abraço, do afago, do amor, de estar
perto, tudo isso estava devidamente acomodado na lata do lixo.
Durou
um mês e apesar de toda a dificuldade, foi um grande aprendizado. Foram necessárias
rupturas para que se chegasse a conclusão óbvia: as pessoas são o que podem,
não o que os outros gostariam que fossem.
Lucille