sexta-feira, 30 de julho de 2010

Máquina de fazer gente melhor

O sinal bateu e começamos a nos despedir. Beijos, bênçãos e um abraço apertado. Um nó na garganta. Ele subiu e no curto espaço entre mim e a porta da escola, se virou para acenar duas vezes. Na última, vi seu rostinho redondo sumir dentro do prédio que um dia já me abrigara também. Novamente o nó. Por que sempre me sinto assim quando ele entra?, me questionei enquanto aguardava mais alguns minutos até ter certeza de que ele estaria bem lá dentro (ou será que era apenas saudade?). Fiquei olhando as mães, pais e quem sabe até outras tias que levavam suas crianças e que provavelmente não se sentiam assim tentando entender o que me afligia. Caminhando de volta, manhã fria e enevoada, refiz também meus passos de 24 anos atrás para tentar achar o motivo que me aperta o peito quando o vejo se misturar as outras pequenas cabeças no pátio da escola.

Liberdade. Foi essa a palavra que me veio a mente. Cada vez que ele entra naquela escola, um novo mundo se abre, uma nova vida se apresenta em forma de conhecimento. Cada vez que ele sai, é uma pessoa com um pouco mais de poder nas mãos, embora ainda não saiba disso. Cada dia é uma nova oportunidade de ser melhor. E, pronto, entendi porque levá-lo na escola me dá prazer e orgulho, ao mesmo tempo em que vê-lo entrar me angustia: no fundo sei que é lá que terá o conhecimento para ser absolutamente livre. Enquanto subíamos a ladeira, apertei aquela mãozinha entre a minha, mas que não tardará a não caber mais. Assim como percebi que a libertação só pode vir do conhecimento, me resignei com o pensamento de que um dia ele não precisará mais ser levado a escola e muito menos de mãos dadas, porque será livre e isso significará ser dono de si e de seus caminhos. Como eu sou. E eu poderia ficar triste, mas apenas peço a Deus que guie os passos dele, para que a vida siga seu curso natural e que tudo aconteça no momento certo.

Um dia desses ele ficava grudado no meu joelho. Hoje já me abraça acima da cintura. E outro dia, quando a voz engrossar e a altura ultrapassar a minha, desejo que a caminhada tenha sido boa e que eu possa continuar participando dela, ainda que isso continue significando acordar de madrugada sem cobertor.

Certa vez uma senhora muito sábia me disse que filhos criamos para o mundo, não para nós. Conversando noite passada com alguém que ainda terá o(s) seu(s) [valha-me Deus!], chegamos a conclusão de que engravidar, parir, criar financeiramente, tudo isso é muito fácil diante da tarefa de educar. Eu gosto e eu quero são expressões que sempre acompanham esse tipo de conversa, mas o que dizer quando se fala em educar, em formar efetivamente outro ser humano?

A vizinha gritava com a filha: “Se apanhar na rua, vai apanhar de novo em casa!” O que se faz nessa hora? Qual a melhor atitude? Ensinar a dar a outra face, a revidar a altura ou a não deixar barato um ato de violência? Realmente, fraldas custam muito pouco diante dessa dúvida.

Por vezes me brotam pensamentos assim, dispersos, desconectos. Lembro de uma tarefa, invento outra, suspiro, sinto saudade, quero escrever. Quando acabo, seco o rosto úmido de um líquido chamado amor.

L.

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Para mim e para os meus

Tenho a felicidade de poder dizer que fui uma criança muito amada e querida por toda a minha família – lado materno e paterno que sempre reivindicaram, cada qual com sua razão, o direito maior sobre minha pele morena, que, na verdade nunca foi mais para um lado ou para outro. Sou muito amada até hoje, por isso não imagino o que seja a vida de uma pessoa rejeitada.

Apesar de o anúncio de minha chegada ter despertado raiva em um e levantado a suspeita de outra – sei apenas destes dois – a minha estréia nesse mundo foi agradável: em pouco tempo todos se apiedaram daquele pequeno ser, frágil e molenga, que ora dormia frouxamente, ora mamava vorazmente no colo da adolescente, com uma pele branca de mãe e um digno nariz de batata de pai.

E esse bebê, tendo todo esse conforto sentimental, se tornou uma mulher destemida e segura. A despeito de todos os dissabores da vida, tenho a certeza de que, haja o que houver, eu tenho duas famílias que me amam e respeitam exatamente como sou e por isso sei que posso me perder em aventuras pois eles sempre me encontrarão e mostrarão o poder curativo do amor.

Pensei nisso hoje, enquanto voltava de Nova Iguaçu. Eu não quero escrever com o gosto amargo da mágoa me fazendo salivar. Quero ser justa, e acho que por enquanto não conseguirei.

Na contramão do egoísmo, sei que de onde vem tudo isso para mim, há também para muitos outros e é isso que quero que continue acontecendo: todos devem ser queridos igualmente, como parte importante de um todo que chamamos família. Desejo que meus descendentes possam ter esse mesmo sentimento por seus irmãos, pais, avós, tios e primos. E desejo mais ainda que meus ascendentes saibam distribuir uniformemente esse sentimento, para que todos tenham um pouco de cada um, que somado, signifique a proteção e o amor que todo ser humano merece ter.

L.

terça-feira, 13 de julho de 2010

Pronta para (re) começar

Gosto de escrever. Gosto mais de escrever do que de falar. Gosto de ver as idéias tomando forma no fundo branco, de imortalizar uma vida, ainda que seja apenas um pouco. Escrever é uma forma de eternizar momentos.
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Talvez por isso eu não goste de escrever sobre momentos demasiadamente ruins, ou repetitivamente ruins. Se me sinto mal, escrevo. Sobre o agente causador, nunca. Ou quase nunca.
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Logo ali, a nova idade me aguarda. E bem aqui, já de algumas semanas, me martela a vontade de nomear todos os animais da minha fazenda: bois, cabritos e touros. Especialmente os touros.
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Há três dias me pus a catalogar todos os meus textos. Não foi tarefa fácil, dado o fato de serem muitos e tanto pior por serem complexos. Em que momento eu estava? Onde foi isso? Ao que exatamente eu quis me referir? De quem eu estava falando? A vontade é de não explicitar os acontecimentos, de deixar que o direito da dúvida permita ao leitor montar seu próprio cenário com os meus elementos e, por assim dizer, tirar suas próprias conclusões.
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Diversas vezes me deparei com textos belíssimos, que se não estivessem em meu blog, certamente duvidaria serem meus. Encontrei erros também, o que me alegrou. Sempre leio e releio antes de publicar, na falta de quem o faça por mim. Mesmo após publicado, leio de novo para detectar algum erro. E se somente agora vejo o que antes não achava, significa que agora sei o que é errado. Mesmo não tendo total certeza do que é o certo.
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Hoje, dia 07 de julho, quase outro dia, a vontade de contar uma história me invadiu enlouquecida como mil cachorros famintos por um osso. Queria já contar, agora preciso contar. E desta vez quero que tenham nomes meus personagens, como tiveram – e têm – vida. Quero que saibam tantos quantos forem os que passarem por aqui para ler, que mais do que uma mulher que gosta de escrever, sou uma mulher que gosta de viver – e por isso escreve.
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Esta sou eu, Lucille, pronta finalmente para o mais verdadeiro de todos os textos. Se não for, terá sido enfim a melhor tentativa.
L.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

3.0 Total-Flex Aditivado

O amor é a única paixão que não admite nem passado e nem futuro. Honoré de Balzac O texto de hoje não é meu, é uma deliciosa crônica de Mário Prata, da revista Época. Eu estava há cinco dias escrevendo os textos que serão publicados aqui ao longo desta semana e fiquei sem assunto para esse post que, teoricamente, seria muito importante. Mas como nada seria capaz de refletir o que sinto nesse momento, com esta nova tríade corpo-cabeça-cabelo (mantendo o peso, segurando a onda e ficando loura), decidi usar algo mais completo. Como de hábito, já me perguntaram o que eu quero para hoje e para o novo ano. Nada demais: dinheiro, casa, carro e um marido rico, inteligente, lindo e bom de cama. Não, falando sério, quero tudo isso, sim, mas sem afobação. Esse é o grande barato dessa idade: não existe mais urgência nas realizações. Eu quero apenas, e querer já me basta para não desistir. E se consegui chegar aos 30 anos, por que não conseguiria tudo o mais que desejo? Sendo assim, quero o dinheiro como fruto do meu suor, do prazer em trabalhar com o que amo. Quero a casa em Santa Teresa, não precisa ser grandona, basta que eu possa continuar sentindo o cheirinho desse lugar em que vivo desde que nasci. Quero um carro pra parar de depender das kombis na madruga! rs Quero um marido. E não abro mão de que seja inteligente e bom de cama, o resto é negociável. Mas até que tudo isso se concretize, não tenho do que me queixar: a vida já está boa. Perfeita nunca fica, porque há de haver problemas para exercitar o perdão, a compreensão e a divertidíssima arte de dar a volta por cima. Os dois problemas do momento são até interessantes e um deles é o coração burro da porra que vive se metendo em confusão, mas aí eu paro e penso: data da formatura marcada, escolhendo música e foto... Sempre tem algo (ou alguém) que salva. Bom, pra quem iria parar no primeiro parágrafo, como sempre, acabei encontrando inspiração. Então segue aí o Mário, aproveitem. E... parabéns pra mim, claro! :-D Lucille
MÁRIO PRATA As mulheres de 30

O que mais as espanta é que, de repente, elas percebem que já são balzaquianas. Mas poucas balzacas leram A Mulher de Trinta, de Honoré de Balzac, escrito há mais de 150 anos. Olhe o que ele diz: 'Uma mulher de trinta anos tem atrativos irresistíveis. A mulher jovem tem muitas ilusões, muita inexperiência. Uma nos instrui, a outra quer tudo aprender e acredita ter dito tudo despindo o vestido. (...) Entre elas duas há a distância incomensurável que vai do previsto ao imprevisto, da força à fraqueza. A mulher de trinta anos satisfaz tudo, e a jovem, sob pena de não sê-lo, nada pode satisfazer'. Madame Bovary, outra francesa trintona, era tão maravilhosa que seu criador chegou a dizer diante dos tribunais: 'Madame Bovary c'est moi'. E a Marilyn Monroe, que fez tudo aquilo entre 30 e 40? Mas voltemos a nossa mulher de 30, a brasileira-tropicana, aquela que podemos encontrar na frente das escolas pegando os filhos ou num balcão de bar bebendo um chope sozinha. Sim, a mulher de 30 bebe. A mulher de 30 é morena. Quando resolve fazer a besteira de tingir os cabelos de amarelo-hebe passa, automaticamente, a ter 40. E o que mais encanta nas de 30 é que parece que nunca vão perder aquele jeitinho que trouxeram dos 20. Mas, para isso, como elas se preocupam com a barriguinha! A mulher de 30 está para se separar. Ou já se separou. São raras as mulheres que passam por esta faixa sem terminar um casamento. Em compensação, ainda antes dos 40 elas arrumam o segundo e definitivo. A grande maioria tem dois filhos. Geralmente um casal. As que ainda não tiveram filhos se tornam um perigo, quando estão ali pelos 35. Periga pegarem o primeiro quarentão que encontrarem pela frente. Elas querem casar. Elas talvez não saibam, mas são as mais bonitas das mulheres. Acho até que a idade mínima para concurso de miss deveria ser 30 anos. Desfilam como gazelas, embora eu nunca tenha visto uma (gazela). Sorriem e nos olham com uns olhos claros. Já notou que elas têm olhos claros? E as que usam uns cabelos longos e ondulados e ficam a todo momento jogando as melenas para trás? É de matar. O problema com esta faixa de idade é achar uma que não esteja terminando alguma tese ou TCC. E eu pergunto: existe algo mais excitante do que uma médica de 32 anos, toda de branco, com o estetoscópio balançando no decote de seu jaleco diante daqueles hirtos seios? E mulher de 30 guiando jipe? Covardia. A mulher de 30 ainda não fez plástica. Não precisa. Está com tudo em cima. Ela, ao contrário das de 20, nunca ficou. Quando resolve, vai pra valer. Faz sexo como se fosse a última vez. A mulher de 30 morde, grita, sua como ninguém. Não finge. Mata o homem, tenha ele 20 ou 50. E o hálito, então? É fresco. E os pelinhos nas costas, lá pra baixo, que mais parecem pele de pêssego, como diria o Machado se referindo a Helena, que, infelizmente, nunca chegou aos 30? Mas o que mais me encanta nas mulheres de 30 é a independência. Moram sozinhas e suas casas têm ainda um frescor das de 20 e a maturidade das de 40. Adoram flores e um cachorrinho pequeno. Curtem janelas abertas. Elas sabem escolher um travesseiro. E amam quem querem, à hora que querem e onde querem. E o mais importante: do jeito que desejam. São fortes as mulheres de 30. E não têm pressa pra nada. Sabem aonde vão chegar. E sempre chegam. Chegam lá atrás, no Balzac: 'A mulher de 30 anos satisfaz tudo'. Ponto. Pra elas.

domingo, 11 de julho de 2010

Nem tudo é o que parece

Hoje eu queria tanto te ver...

Queria saber que ainda está bem, ou melhor, que já está ótimo. Saber eu sei, mas queria mesmo ter certeza de que tudo que você fez valeu a pena. Para você. Queria ver sua barba feita, rosto limpo de quem aprendeu a se cuidar. Queria ver sua roupa - se bobear deve ser alguma que eu dei - e constatar que também aprendeu a se vestir. Queria perceber em sua forma física, o corpo que já foi meu. Hum, como eu queria... Queria ver em teu conjunto a pessoa que participou da minha caminhada por três anos e meio. Queria que você estivesse bem perto de mim, perto, muito perto. Queria seus ouvidos, olhos e todos os poros atentos a mim. Queria te dizer uma coisa... E me prometa que não vai esquecer nunca de minhas palavras, pois talvez não sejam importantes para ti ouvi-las, mas serão inesquecíveis para mim quando eu as disser. Guarde só para você, ok? Não deixe que ninguém saiba, nem veja o que tenho guardado apenas para você. Só para você. É o único que merece saber o que sinto por ti. E não posso mais guardar isso só pra mim. Então preste atenção em mim...

Sabe o que eu queria te dizer?

Algo que me atormenta há dias...

... há meses, desde que você se foi.

Queria te olhar bem nos olhos, de pertinho até quase poder sentir sua respiração e dizer...

VAI PRO INFERNO, SEU VERME MISERÁVEL DESGRAÇADO!

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Eita, Lelê!

Ah, como eu gosto disso... Mima, paparica, beija, abraça, morde, silencia, pega, aperta, chupa, olha, fala, sorri, acende, suspende, reina, manda, obedece, pede, briga, chora, caminha, anima, entristece, come, bebe, absorve, aprende, ensina, foge, confunde e adora. Já que gostou tanto, repito. Só pra você. L.

terça-feira, 6 de julho de 2010

Um elefante abatido por um avião

Se você não sabe o que quer...
Não abra os olhos.
Não levante da cama.
Não saia de casa.
Não fale.
Não ouça.
Não se mova.
Não trabalhe.
Não atenda o telefone.
Não ligue.
Não estude.
Não olhe. Não procure o que não sabe. Não pergunte nada. Não se meta. Deixe que as pessoas sigam seus caminhos sem a sua desagradável dúvida. Não incomode, não pense, não ria. Não diga que gosta, nem que desgosta. Não minta. Não finja que acredita. Não dance, não ria. Não beba.
E se cabe uma última sugestão: se não sabe o que quer, tenha cuidado ao ficar assim, parado na rua, olhando pro nada. Pode ser que um Jumbo atravesse o seu caminho e atropele seus sonhos com a violência de uma manada enfurecida.
Sabe de uma coisa?
Cansei de palhaçada!
L.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Gengibre e Mandarina

O dia foi animado, vitorioso. Chegou a hora em que ela entendeu que bastava pouca coisa para ser feliz. E estava feliz, porque amava a si mesma muito mais do que qualquer tempo da vida de que pudesse se lembrar. Ela sempre soube que jamais poderia se entregar a alguém com a honestidade necessária se antes não chegasse a esse ponto de maturidade. E enquanto o vendedor a atendia, ela sorriu feliz, diante da constatação de que havia finalmente chegado onde queria, estava bem consigo mesma o que a deixava pronta para o sentimento que há dias batia em sua porta. A noite chegou e com ela trouxe alguns sentimentos velhos, porém com o trunfo de já saber o resultado e poder fazer diferente, ela aceitou-os sabendo que, para que haja um relacionamento sério, é necessário que ambos estejam sintonizados com o mesmo objetivo. Apesar de adorar bater pernas em dias quentes como aquele, ela preferiu voltar cedo para descansar, já que a noite teria de estar bem para mais uma bateria de provas do conhecimento alheio. Cada dia era um capítulo que lia naqueles olhos castanhos e isso era bom, porque ótimo era quando ele gostava do que aprendia sobre ela.

O dia começou cedo, como de costume. Ele gostava de acordar cedo a fim de aproveitar o máximo que pudesse do dia. Na mente ainda estava fresca a noite passada com ela. Era a oportunidade de recomeçar, de ter do lado alguém com quem valesse à pena estar, apenas por estar assim, sem nada pra fazer, observando e absorvendo o melhor de um ser humano. Ela sabia se dar, não tinha frescura, era linda, engraçada, calma. O meu relacionamento anterior acabou há pouco tempo, ele pensou com seus botões. Mas há data certa para ser feliz? Enquanto se perdia em pensamentos, ela ligou. O dia sempre ficava melhor quando falava com ela. E apesar de ter amado a ex, desta vez ele estava mais leve, mais a vontade. Talvez fosse a idade, já que estava finalmente consciente de suas prioridades e realizando-as, então não havia mais a cobrança de ser marido e pai, apenas ser ele mesmo, devagar e sem medo. Saiu de casa para cuidar de si, querendo muito encontrá-la mais tarde, mas sem ansiedade. Ver-se-iam no fim do dia quando seus deveres estivessem cumpridos, o que tornaria o momento mais especial, seriam um do outro apenas, como vinha acontecendo há várias semanas.

Vivo no pensamento de ambos, estava o lugar em que ficaram conversando noite passada, quando ele disse a ela com todas as letras o que queria, e pontuou diversas vezes que ela estava linda, metida num vestidinho preto e de salto alto, simples e fabulosa. Chegando mais perto descobriu que ela usava um novo perfume: gengibre e mandarina. No mesmo lugar, ela o havia medido de alto a baixo procurando algo de que não gostasse sem no entanto encontrar, sentido o toque firme de seus dedos e tido certeza de que ele era realmente belo, paciente e amável.

Como nada é tão perfeito sempre, o desentendimento tirou o brilho dos olhos de ambos. Por que, afinal, você não me avisou que poderia me magoar? Provavelmente pensaram juntos, ao mesmo tempo em que outras palavras tornavam o dia pesado, contrariando tudo que já nutriam um pelo outro. Contudo, sentimento que é forte não se desfaz assim. E quando o diálogo e a sinceridade temperam a relação, tudo é capaz de ser resolvido.

Olharam-se como estranhos, uma mágoa brutal se interpunha entre eles. Não se abraçaram, muito menos houve beijo. O encanto parecia estar acabado. Seguiram lado a lado, em silêncio, até a praia. A grama rasteira ofereceu lugar para abrigar o embate que se seguiria. Olhando o mar bater nas pedras, ele principiou a falar, mas já deveria saber que não adiantaria muita coisa, já que reconhecia seu erro. Internamente ela queria gritar, xingar tudo o que sabia, dar-lhe as costas e sair batendo os cascos, certa de que não voltaria a vê-lo. Nesse caso, não voltar a ver não seria o mesmo que não querer, e ela o queria ainda. Mas ela não poderia agir assim, não com ele. Ele estava vendo a mulher que tanto queria fugir de suas mãos e não sabia exatamente o que fazer, queria prendê-la de novo no abraço, queria beijá-la, queria amá-la ali mesmo, sob o sol da tarde. Ela imaginava que ele não fosse mover meio dedo para reverter a situação, mas não iria forçar nada. Sabia que não havia nada pior do que influenciar alguém a agir de acordo com o que você quer. Se não fizesse realmente por vontade dele, seria sinal de que não a merecia. Ela expôs tudo o que sentia e o que pensava, aproveitou para se despir ainda mais da intenção de passar como santa, foi verdadeira e abusou do direito de usar todas as palavras que conhecia, bonitas ou feias. Ele sabia que ela estava certa em suas colocações, só não havia entendido antes e naquele momento em que prestava atenção, compreendia exatamente o que havia acontecido. E sabia também o que devia ser feito, porque mesmo que ela não quisesse mais, ele teria agido como um homem de verdade deve agir e até porque, não estava disposto a deixá-la ir embora fácil assim. Ela silenciou. Ele falou. Ela continuou olhando o mar, ouvindo o que ele dizia, tentando ajustar aquelas palavras ao que ela sentia. Pedidos de perdão e promessas de não reincidência. Quando todos os argumentos foram usados, ela viu caída no gramado, morta e derrotada, a mágoa que carregara até ali. Ele ainda não sabia se ela o havia perdoado ou se a tinha perdido, até que ela esboçou um sorriso. Exultante, percebeu que a possibilidade era real, que ela ainda era sua. O dia estava no fim, não havia mais calor do Sol. Decidiram andar. Enquanto caminhavam, ele pediu um beijo, ela não queria contato físico ainda, mas ele não se deu por vencido: parou-a e insistiu até que ela não teve saída a não ser trocar um rápido beijo. Posso te abraçar? Não. Estava louca para se perder naquele peitoral, mas sabia ser má quando queria e aquele era o momento, afinal, estava se divertindo em vê-lo ansiar por ela. O fim da caminhada coincidiu com a vontade de ver filme e foi o que fizeram. Na sala escura, a proximidade dos corpos foi inevitável. Ela resistiu até que se tornasse impossível conter a vontade de se afogar nos beijos dele e quando não mais pode evitar, beijou-o com ternura, com paixão e tudo voltou ao normal, porque ambos precisavam daquele momento.

Depois de toda a tensão, a paz voltou a reinar nos sorrisos dos dois, que se reconheciam como pessoas diferentes e capazes de completarem um ao outro. Sabiam e sentiam que precisavam de mais tempo juntos, de outra noite e outro dia para restabelecer o contato perfeito de suas almas. Então se deram de presente uma chance de conhecer outra vez aquilo que já sabiam ser maravilhoso.

Sem medo e sem pudor, ela tirou salto e camiseta e se deixou ser admirada enquanto se despia. As costas nuas, os cabelos cascateando pelos ombros a tornavam ainda mais bela. Ele a observou, algo entre virgem e ordinária, tão segura de si quanto frágil, revelando o corpo que ele desejava como se fosse a primeira vez. De pé, na frente dele, ela sentia os lábios quentes a correr por seu pescoço. Ele abraçou-a por trás e moveu a cabeça dela até que ambos pudessem se olhar no espelho. Nus da cintura para cima, notaram como faziam um casal bonito e, naquele momento, muito feliz. Enquanto ainda se perdia em pensamentos, ela sentiu que ele a soltava. Com um movimento rápido e preciso, tomou-a no colo e calmamente levou-a até a cama. Pousou-a com delicadeza como quem guarda uma jóia em caixa, acomodando-a para não arranhar. Ele a beijava mansamente enquanto a deitava sobre os travesseiros macios, para em seguida correr os dedos para o meio de seu corpo e abrir o botão da calça. Ela se arrepiou com o toque em seu ventre, enquanto ele a despia com atenção e carinho, sem parar de beijá-la. Sentindo-se a virgem da tribo que se dá em sacrifício, permitiu que ele conduzisse o momento, entendeu que aquela seria a hora de deixá-lo comandar e a ela bastava, por hora, ser o que ele quisesse. Dar-se-ia de corpo e coração em suas mãos. Mudando de extremo, ele se pôs a puxar a calça dela, completamente dominado pela visão que se descortinava a sua frente à medida que tirava a roupa que a cobria. Por segundos passou de caçador a caça, porque ela conseguia isso sem muito esforço, mas logo reassumiu sua posição ao lado dela. Beijou-a como se fosse a primeira vez, com toda a calma do mundo. Ela lhe devolveu beijos mais intensos, como se fosse a última vez. Ele passou a fazer desenhos invisíveis com os dedos sobre o colo dela, testando sua resistência. Brincou com seus mamilos rijos, sentiu-a arquear de prazer, mas não queria fazer com que esperasse muito, essa noite seria dela. Segurou seus seios ao mesmo tempo em que a beijou o pescoço. Ela se encolhia, sentia o corpo diminuir em resposta aqueles toques que pegavam em pontos fracos, porque diante daquele homem todo seu corpo se tornara fraco. Ele desceu a mão por sua barriga, ventre e pousou em seu sexo, quente, úmido e macio. Ela sentia a mente dar voltas ao mundo, coração disparado de aflição e desejo, sentimento tomando forma e brigando para entrar de vez, enquanto o corpo gritava para tê-lo em si. Ele ainda esperou mais um pouco, tocou-a mais, sabia que ela gostava, fazia com que ronronasse baixinho como uma gata diante do pires de leite, abriu-a, disse a ela como gostava de vê-la assim, pressionou os dedos mais outras vezes, o que o permitiu entender que ela esperava por ele com urgência de vida ou morte. Ele puxou-a para junto de si, costas coladas ao seu peito, o vão da espinha dorsal brilhando com o suor que escorria de sua pele. Ela estava prestes a perder a razão, mas empinou os quadris, se instalou confortavelmente na frente dele e deixou que ele a segurasse firme pela cintura. Lentamente ele a penetrou, movimentos cadenciados, ritmados com a paixão de ambos. Apertou-a como se ela pudesse escapar dali, ouviu-a gemer mais forte e alto, querendo mais. Enquanto se amavam, seus corpos se uniam em oração, suas mentes fugiam juntas para algum paraíso perdido. Enquanto se amavam, o mundo lá fora deixou de existir, só havia os dois e suas palavras, seus beijos e seus cheiros que se misturavam. Enquanto se amavam, se perdiam. Das palavras fizeram vida e a vida explodiu em ambos quando não mais conseguiam ser um só. Luzes, chamas, ventania. Amor e ódio, guerra e paz. Paz. Vazio. Silêncio. Ainda com a carne trêmula, ela tocou as mãos dele. Nada precisava ser dito, se olharam profundamente e tiveram certeza de que estavam diante de alguém especial. Quando se despediram, o abraço carregava tudo o que sentiam, que não precisava de rótulo ou qualquer definição, era apenas sentimento bom, algo que faria com que momentos ruins que inevitavelmente teriam, terminasse com conversa, compreensão, carinho e amizade fortalecida.

L.