Uma
luz batia forte e insistente em meu rosto. Ignorar não foi fácil: ela queria
chamar minha atenção de alguma forma e parecia tentar me mostrar algo. O vento
se uniu a ela e bateu as janelas. Com o barulho e a semi-escuridão repentina fui
obrigada a levantar. E quando reabri as janelas, ele estava lá...
Majestoso
e belo, o Sol brilhava sereno sobre a copa das árvores, sobre as casas, no meu
muro, no meu rosto. Não era um Sol qualquer, eu percebi desde o momento em que
pus os olhos: era a luz daqueles dias, os dias em que saíamos de mãos dadas,
como se nada mais no mundo pudesse importar, a não ser os nossos planos.
E não
era mesmo um Sol como os outros: aquele Sol das tardes de sábado, em que
saíamos de casa, do “nosso ninho” como chamávamos carinhosamente o barraco
cravado no meio de uma favela sangrenta, para buscar aquele que seria de fato o
nosso lugar, nosso e de nossa família.
Não
faz frio e nem faz calor, o vento corre suave, agita os cabelos, faz o corpo se
sentir bem e refresca a mente. É uma tarde calma como aquelas, em que andávamos
por Maria da Graça, Del Castilho e Cascadura em busca da nossa casa. “Tem que
ser perto de estação de trem”, “ou do Metrô”. Subir ladeira? Andar demais até a
estação? Um quarto só! E as visitas, e minha bagunça, e meu escritório? Rua
Miguel Rangel... “Aaahhnnn, é esse, amor!” — olhos brilhavam como criança
quando acha o presente escondido atrás da árvore de Natal.
Muito
pequeno, muito caro, muito longe, perto da favela. Nunca estava bom. Ou sempre
estava, mas não era o momento certo de unir as escovas de dente (ou o medo era
mais forte que o desejo).
De
todo jeito, essa tarde de hoje me levou a 2007. Uma história que poderia ter
sido escrita de tantas formas, mas quis o destino que fosse desta. E antes me
levava as lágrimas, hoje me faz sorrir. Foi boa, foi intensa — foi dolorosa,
cruel —, mas teve amor, isso não se pode negar. Era uma emoção a cada semana,
boa ou ruim, nunca era rotina.
Ontem,
conversando com uma amiga, contei que estou revirando meu ser para perdoar.
Preciso fazer isso, recebendo um pedido ou não, eu tenho que perdoar para
seguir em frente. Já me recusei a ouvir aquelas músicas, a lembrar daqueles
seis anos, especialmente os primeiros, já tentei fingir que tudo não havia
passado de um sonho ruim. Isso só piora. Está gravado na minha pele, no meu
coração: foi tudo real. Então eu decidi apenas perdoar o que foi ruim (porque
foi péssimo), agradecer o que foi bom (porque foi sensacional) e guardar lições
e esse Sol das tardes de sábado, que, enquanto escrevo, vai se escondendo atrás
da mangueira no pátio da escola.
LN
P.S.:
Há duas semanas venho controlando o desejo de fazer contato, não por saudade,
nem por amor, apenas para dizer que o vi e desejo que esteja tudo bem, tão bem
quanto parece e que o perdôo, ainda que ele nunca peça. Mas se algum dia essas
palavras chegarem até ele, até você Michel, gostaria que soubesse que o guardo
no limbo do meu coração, mas trabalho para que chegue o dia em que eu possa
dizer para mim mesma que valeu o aprendizado e por isso vale o perdão.
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