segunda-feira, 7 de junho de 2010

O maravilhoso som da vida

“Aponta pra fé e rema” (1)

A música é para mim muito mais do que uma voz que sai da caixa de som. É, muito mais do que qualquer significação lógica, a maneira que encontro de expressar sentimentos que não sei como definir, escrever ou mesmo contar. São produtos prontos e acabados, embalados e entregues para dizer a mim e ao mundo que meus pensamentos e vivências não são exclusividade minha: alguém pensou e passou por isso antes. Ou, na pior das hipóteses, uma previsão do que estava por vir comigo e com mais outro alguém pelo universo a fora.

Quando gosto de uma música, não é simplesmente por causa da melodia, da voz do intérprete ou porque está na moda. Minha preferência, antes de tudo, tem que ver com o momento. Já passei noites, por exemplo, sonhando com o príncipe encantado ao som de Beijo Doce, da extinta banda de funk Copacabana Beat. E outras também olhando o infinito com cara de sou-a-pessoa-mais-feliz-do-mundo ouvindo Frenesi, do grupo de pagode Pixote. São situações musicais inimagináveis para mim, mas que sim, fazem parte da minha história, da qual me orgulho e faço questão de preservar. Da mesma forma que Stevie Wonder, Jon & Vangelis e Michael Jackson me trazem a memória pessoas amadas, três que figuram entre as mais importantes.

E assim, Sarah Bairelles sempre irá me remeter ao inesquecível Carnaval em Cidade Ocidental-GO e Brasília-DF; K Young, Tamia e Dughettu sempre falarão de uma linda e eternizada história de amor sincero; Boyz II Men e Los Hermanos sempre trarão para junto do peito um amor que transcendeu a amizade; Racionais MC’s sempre terão o poder de remexer em feridas cicatrizadas para mostrar que a guerreira não está morta.

Pensei nisso tudo porque achei no tal pen drive algumas músicas que me fizeram analisar uma série de coisas do passado sob nova ótica: agora de quem já passou e só ficou com a lição.

Era tarde de um sábado quente, estávamos seguindo para Nova Iguaçu. No carro a conversa estava animada, um tanto tensa de minha parte, que não sabia exatamente como agir diante daquele retorno repentino. Talvez pensando o mesmo que eu, ele interrompeu o assunto.

— Ah, quero te mostrar uma coisa. – falou, tirando um CD do porta-luvas.

— O que é? Música nova?

— Não, mas é uma música que me faz pensar em você.

“É, morena, tá tudo bem.

Sereno é quem tem

A paz de estar em par com Deus” (2)

Mais uma vez uma música respondeu a tudo, ou quase tudo, que eu precisava saber.

Então estava aqui ouvindo Los Hermanos novamente, sentindo umas saudades gigantes, dele, dela (que também gosta do grupo) e parei numa outra música chamada Sapato Novo. Coração apertou bem pequenininho... Ele estará de volta em alguns dias, ela não mais. Los Hermanos é uma banda de rock-melancólico que não me agrada, mas suas letras por vezes me pegam assim, desmascarando sentimentos que eu teimava em dizer que não tinha. E pensar o que pensei ouvindo aquilo me fez entristecer realmente. Mas como eles mesmos cantam “Nem choro mais, só levo a saudade, morena. É tudo que vale a pena” (3).

Sequei as lágrimas do pensamento, porque nem tinha mais o que pensar, e fui tratar de viver. Agora outra música... Mulher Elétrica está no topo, seguida por O Jogo é Hoje, fechando com Tá na Chuva, todas dos Racionais, cada qual com seu importante significado para mim.

O costume de rejeitar tudo que me lembre, de alguma forma, pessoas que me fizeram mal, provavelmente começou a encontrar seu fim. Desde o ano passado identifiquei que o gosto pela cultura e mitologia africana tinha sido colocado no mesmo patamar que o herege do meu ex. Tudo relacionado a esta belíssima história dos meus antepassados se resumia a um “Deus me livre” como se eu mesma não tivesse vindo de tudo aquilo. Eu vim e cá estou para tentar aprender mais e perpetuar a riqueza do povo que veio para cá a força, e com amor construiu uma nação de negros com brancos e índios, que misturados entre si formaram este fantástico povo brasileiro. E para não cometer o disparate de me achar a detentora da verdade do mundo e abrir a boca para dizer – com total propriedade – que a umbanda é nacional [Que religião afro é nacional, anta?! Se orienta, garota.], busquei lá dentro o respeito que sempre senti pelo passado e a vontade de ajudar a escrever a História também. E nessa volta triunfal às origens, ao meu herói Kunta Kintê, aos orixás, as religiões afro-brasileiras (trazidas por escravos africanos e adaptados a realidade dos negros brasileiros), aos que vivem hoje no continente africano, ao povo de Gâmbia especificamente, que ouvindo É D'Oxum de Rita Ribeiro na rádio MPB FM (música brasileira, meu povo!) lembrei que, apesar de ter a minha fé bem resolvida e solidificada no coração, também faço parte disso tudo que existe na Terra. Esta orixá, dizem os verdadeiros entendidos no assunto, é a que me governa, seguida de uma outra chamada Iansã, que me toma a frente. Ouvi a música num momento tão bom, em frente a Igreja de N. Sra. das Graças e concluí que o divino mora em mim e não o contrário. Sou a favor de tudo que me faça bem, de energias positivas. E foi ouvindo a música Picture of Jesus, de Ben Harper, que percorri outra vez a planície de Zamunda, nalgum lugar da África, meu reino perfeito escondido em mim.

Hoje também tinha uma coisa para contar. Na verdade três, mas as palavras não se irmanam com a vontade de escrever. Talvez haja uma música que explique isso mais lá na frente, que encontre em mim a motivação de expor esses fragmentos tão enraizados em mim, que de tão profundos não alcanço ponta para puxar e colocar a luz da razão; sei apenas sentir, por ora.

Fecho este dia, domingo, 6 de junho de 2010, com Yanni e sua Until the last moment. Dia bom, divertido e cheio de esperanças positivas.

Obrigada, meu Deus. Eternamente obrigada por tudo. Amém.

L.

(1), (2) e (3) Dois Barcos, Morena e Sapato Novo – Los Hermanos

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