segunda-feira, 17 de maio de 2010

Série Triunfo - Um é pouco

Hum... Coisinha boa... Trec! Estalam os dedos da mente e das mãos, prontos a colocar vivos alguns dos mais insanos momentos desta caminhada.

Infinitamente bom estar de volta!

Deixem-me esclarecer: não voltar ao blog, ou a vida, ou a internet. Apesar do sumiço aparentemente voluntário, na verdade faltava um detalhe que me permitia estar inteiramente presente: eu mesma. Havia corpo, havia pensamento, havia até inspiração, mas nada se unia a nada para formar um texto que valesse a pena publicar. E, ora bolas, eu sou uma escritora, afinal de contas! A melhor da minha casa, sem dúvida nenhuma. Então sabia muito bem que para registrar algo, há que se ter em uníssono mente e coração. E nestes meses de ausência, tão sentida quanto querida e forçada, nada casava com nada. Figurada e literalmente falando.

Pois bem, cá estou, enriquecida com minerais, ferro e vitaminas, madura e colhida do pé. A ideia dessa frase tirei da música de Maria Gadú, a nova cantora-musa da MPB. Bem, musa não é exatamente o que se pode dizer da pessoa, tipo Maria Rita (diva eterna!) e Roberta Sá, mas também e felizmente, não tem aquela voz macho-potente das demais cantoras homossexuais assumidas. Também não sei se ela é, embora todo mundo diga que sim, mas o que me importa quando aquela voz romântica embala minhas tardes superaquecidas no Skype? O CD que leva o nome da anti-diva esteve presente em quase todos os meus dias desde que, em dúvida sobre se iria gostar ou não, arrisquei e acabei caindo de amores. E é justamente por isso que ele não sai do player, pois não foi apenas com o fato de comprar um CD, foram vários medos perdidos e se eu pudesse nomear esse capítulo da caminhada, diria que se chama Coragem.

Há uma diferença entre ser menina peituda e marrenta de 18 anos, destemida e temível, cheia de si e vazia de vergonha, especialmente na cara e entre ser uma mulher de quase 30 anos, sentimentos moldados com a experiência, medos comprados ou impostos, porém determinada a virar a mesa do jogo. Agora eu sei onde posso pisar e não em quem. Agora eu sei como fazer, muito embora o que fazer ainda não esteja completamente claro. Aos 18 anos, traída e magoada, dei ao namorado um pouco de seu próprio veneno, ou pelo menos achava que estava dando, ao sair com o vizinho dele numa fuga espetacular, para no dia seguinte contar tudo a ele, confiante de que ele choraria os mesmos rios de sangue que eu. Hunf! Claro que deu em nada. Ele olhou-me agudamente e disse “Você terminou comigo ontem, lembra? Então pode sair com quem quiser.” E isso frustrou meu plano diabólico, além de me render um pequeno tarado atrás de mim por alguns dias. Como os anos passam, homem não muda e mulher se aperfeiçoa, eu aprendi finalmente que ele sempre vai trair com a cara mais lavada do mundo, achando que é máximo ter vinte vaginas ao mesmo tempo e que não há nada demais em engravidar algumas delas. E entendi também que não sente um pingo de dor ao ser traído, ainda que ame sua mulher (o que em geral é difícil, mas acontece), mas que nutre um desejo quase animal de poder chamá-la de vagabunda quando descobre a traição. Engraçado, não? Mulher tenta a todo custo superar, mas homem carrega a bandeira na qual se lê CORNO com tamanha vontade que parece até um profeta pregando o fim do mundo. “Aquela vagabuuuuunda!” Já repararam como eles carregam no u? Deve ter algum sentido psicológico aí que eu não consigo identificar, mas me parece que quanto mais “us” mais grave foi a traição. E agora aos 29 anos, entendi que a liberdade é parte da constituição do ser humano, então perdi o medo e fui a luta. E quando ele me perguntou se eu o havia traído, refleti, puxei da memória todas as vontades de fazer e a infinidade de oportunidades e neguei. Fiquei pensando em quantos “us” eu ganharia...

Apesar de estar ali, sentada ouvindo que durante um ano inteiro fui traída com a amiga Juliana, a mesma que ele disse achar feia, a mesma que eu vi e ele jurou que não aconteceu nada, a mesmíssima que ele disse nem falar mais, a mesma que enquanto eu estava na cama com pontos da cirurgia para tentar parir um filho dele, ele mandava mensagens de texto jurando amor eterno, enfim, a mesma composta de pele e ossos, daquele tipo que fazer sexo anal não seria um bom negócio a não ser com uma almofadinha e, resumindo, a “mulher ideal”, segundo ele. Eu pensava que fosse pegaçãozinha, mas que nada, a Sra. Ideal circulava ativamente como oficial no barracão de candomblé do herege e até mesmo na casa da minha ex-alcoviteira-sogra. E eu operada, trabalhando, cuidando da casa, tirando o lixo pra não morrer afogada nele enquanto a Rainha de Sabá dormia até meio-dia. Ok, ok, erro meu, eu assumo. Se reinou na minha casa foi porque eu permiti. E foi justamente esse tipo de coisa que construiu e solidificou em mim a consciência de que cada um é responsável por seu destino. Se o pai o expulsou de casa, o que tinha eu que acolher?

Enquanto eu me recuperava de uma cirurgia invasiva e da qual dependia a continuação da minha vida, ele se fazia de galã. O corte fechou, pontos caíram, eu descobri tudo e então eu pensei: feminino de galã, por acaso é galinha?

Não me arrependo em momento algum, muito pelo contrário. Foi com uma louca gritando no meu ouvido que eu aprendi e me apaixonei pelo que faço e por isso hoje sou RH. Foi preciso um moleque para eu amadurecer, e por isso eu aprendi e me apaixonei outra vez. Só que agora, por mim mesma.

Pensei: a Juliana deve ser uma santa, afinal aturar essa porra não é tarefa das mais fáceis. Aí eu vi: ela mal sabe o português correto, então repensei: se merecem. Ai, que dura! Não, apenas sincera. Eu tinha mesmo que passar a minha vida inteira lendo eXtresse, cido, ensima? A troco que de quê? Fiquei contando nos dedos os prós e os contras... aquilo que era ótimo virou raro, depois passou a ser nojento, até o dia que se tornou nada. Então o que sobra? Pena? E quando eu tenho problemas, quem tem pena de mim? Quem segura minha onda quando eu choro de saudade da minha mãe? Quem é que me ajuda a acreditar no amanhã quando tudo vai mal? Quem me daria a mão outra vez, como eu fiz, mesmo tendo sido tão magoada ano retrasado e passado?

Passei os últimos dias com ele sem fazer força para entender a traição. Nem mesmo me dei ao trabalho de ligar pra todos os disponíveis da cidade a fim de não passar a noite pensando nisso. Todos os dias eu acordava bela, disposta, enfiava o corpo numa roupa bonita e saía de casa para buscar no trabalho o prazer de ser uma pessoa útil, de construir a história do mundo, da vida e a minha. Dessa vez eu não senti raiva, nem mesmo a dorzinha no peito. Nada. Absolutamente vazio. Também não deu tempo de sentir.

Minutos após sentar, lá estava a mensagem “Bom dia morena bonita”. Não, não era essa mensagem. Nem sempre o dia começava perfeito. E aí vinha a salvação esfuziante, efervescente e gigante: “Booooooooooom diaaaaaaaaaaaaaa Morena bonitaaaaaaaaaaa!” E então o dia estava ganho. Como uma pessoa consegue ser tão inspiradora a ponto de fazer com que outra resgate a vontade de estar ali, mesmo fazendo o que não gosta? Logo vieram o vinho e o DVD, o cobertor e o cafuné. A sensação de proximidade era nítida e o calor insuportável. Quando o telefone tocava, o ambiente se perfumava de azul e as borboletas dançavam comigo. As vezes mesmo com vontade de chorar de raiva, eu mudava para gargalhadas profundas de pura felicidade só por ouvir aquela voz grossa e atrevida, que me prendia na cadeira ao mesmo tempo que me sacudia em espasmos violentos de alegria. A coragem nasceu aí e se fortificou quando eu percebi que dependia apenas de um avião e mais 45 minutos para tornar tudo perfeito.

Continua.

L.

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