domingo, 1 de março de 2009

"Diga não a turbulência" - Carnaval 2009 e outros acontecimentos

Clact! Os dedos estalam sobre as teclas macias. Ou talvez seja a mente que estala, acordando de um sono induzido. Algo está errado. Pronto, agora sim. Maria Rita preenche o ambiente, com sua voz macia e deliciosamente calmante. Lanço-me diante da tela branca faminta pelo poder de transformar pensamentos em palavras. Mas penso que podem não sair, dado o tempo de cativeiro em que ficaram, subjugados pela força maléfica da ausência de um computador doméstico. Em breve começarão a borbulhar. Agora, reservo-me o direito de escrever errado várias palavras, apagá-las e tornar a escrever certo, como se fosse a primeira vez. De certa forma, assim é, afinal, foram quase dois meses sem realizar o hábito que, ao lado da prática sexual e da degustativa, é o que mais me faz feliz. Não respeitarei limites temporais, deixarei que as informações que flutuam em mim, tomem forma e ajeitem-se em seu desordenado eixo conforme forem surgindo. Espero que fique bom. Caso contrário, terei de continuar tentando produzir algo que valha a pena ser lido, com a mínima esperança de que, quem sabe, mereça ser lido. E é essa tentativa, a verdadeira razão deste sorriso que me acompanha. Lucille 23:05 – 28 de fevereiro de 2009.

O dia estava quente, porém parcialmente nublado. Sem nada melhor pra fazer, aliás, era exatamente o melhor que poderia fazer por mim numa tarde de sábado, entreguei-me aos cuidados de manicure e massagista no salão. Relaxada e bela, saí do salão com um convite pra passar a noite na farra. Aquilo que eu detesto fazer e só faço mesmo por obrigação ¾ de ser feliz. Lá fui eu, vestida de desejos e ansiedade, rumo ao local desconhecido, onde sabia que não haveria nenhum olhar acostumado a mim, e, portanto, não haveria julgamentos. A noite estava tão quente quanto havia sido o dia. Junto dos amigos – verdade seja dita, um dos amigos é o melhor irmão de todos os tempos -, comecei a noite regada à vodka. Uau! Lucille... Mandando ver na destilada! Hahaha A música em uma das três pistas da casa era hip hop, e apesar do ritmo já conhecido, as músicas eram diferentes, tocadas de forma diferente e absorvidas idem. O primeiro passou e parou. Logo eram dois. Eu, dançando e eles observando, ambos se preparando para dar o bote na presa indefesa. Talvez estivessem decidindo quem iria ou se era a hora. Sob a fraca luz do ambiente, não distingui-lhes as feições, mas sabia que o alvo daqueles insistentes olhares era eu. Ao largo ele passou. Olhou-me e parou quase como eu autômato diante de mim. Olhamo-nos e aconteceu mais um daqueles momentos em que as palavras são absolutamente desnecessárias. Deixei-me ser levada ao andar superior, onde havia luz e onde a Luz reinou. De mãos entrelaçadas, tal e qual crianças fujonas, descemos ao primeiro andar em busca das palavras, mas elas não estavam lá ainda, não precisavam estar lá.
O abraço apertado fez ruir o chão sob meus pés e o beijo macio e urgente me levou além das fronteiras da razão. Ficamos ali, longe dos dois grupos de amigos, longe dos olhares conhecidos e reprovadores, um tempo divertido, envolvidos em nossos próprios fios de alta tensão. Fiquei encantada com a simplicidade dele, tanto quanto sugeria seu nome bonito, pequeno e bíblico. Havia entre nós um invisível e inaudível elo, forte o bastante decidir que a noite poderia ter fim ali mesmo, porque a nossa história não teria. De volta a pista de dança, joguei-me com vontade ao som da velha black music, ordinária toda vida, mas deliciosamente inesquecível. Ele me olhava e não havia naqueles olhos sinal de posse ou reprovação, e isso me motivava a gostar ainda mais daquela companhia, que respeitava meu espaço e me recebia com um demorado abraço cada vez que a música parava.
Quando decidimos procurar o restante do povo, nos deparamos com o danado do funk acontecendo na pista de baixo. Pensei: é agora, ou ele se apaixona ou me larga de vez. Esse é o ritmo do mal, que ferve o sangue, transforma virgens em putas e as disfarça em santas. Somos todas farinha do mesmo pirão, rebolando freneticamente quadris e cabelo. E como estava na chuva, aproveitei a água pra lavar a alma. Dancei a vontade enquanto o suor me escorria pela pele bronzeada. Observei-o ficar ligeiramente boquiaberto. Ri sozinha ao imaginar as idéias pervertidas que deveriam povoar aquela mente naquele exato momento. E como eu havia pensado... Saímos dali pra voltar ao ponto de partida, onde ficamos até que um zeloso irmão foi me avisar que a noite chegaria ao fim em alguns minutos. A separação iminente trouxe algumas revelações, palavras bonitas e promessas. “Eu não quero que vc vá embora, não quero te perder.” Adiamos o fim até quando o cansaço deixou, mas meu corpo, apesar de relaxado, ficou esgotado com a noite black-funk. Quando finalmente nos separamos, ri sozinha ao resumir os acontecimentos pra mim mesma. O saldo fora positivo. Foram cinco copos de vodka, muita risada, o dobro de beijo e o triplo de dança.
Durante a semana, os acontecimentos foram atropelando-se e quando percebi, estávamos juntos novamente, almoçando e fazendo compras. Dias depois, me tornei propriedade particular, com contrato e escritura definitiva, único dono, motor 2.8, versão 2009, completa e com kit gás, água, luz e fogo.
*-*
Carnaval no Rio de Janeiro. Samba, suor, cerveja, curtição, praias lotadas, blocos, beijo na boca, festa, micareta, sexo, turistas, alegria, festa, desfile de escola de samba, Terreirão, sol a pino, 40° a sombra. Definitivamente cansei disso tudo. Quando surgiu a oportunidade, aproveitei que essa época do ano reuniria isso tudo que eu não curto mais e parti rumo ao lado contrário: o sossego de um colo amigo. Há alguns meses venho tomando decisões. São atitudes que definem os passos que devo dar e em qual caminho. O carro-chefe desse conjunto de ações é Deixar Acontecer. Como bem me mostraram duas pessoas, uma com pouca idade e outra com muita, eu deveria parar de idealizar as pessoas e querer que cantassem a minha letra da música. E em seguida, Ser Feliz Comigo. Eu sou a responsável por minha felicidade, tenho de estar bem deitada em minha cama, com meu livro e minhas uvas passas brancas. Se estiver noutro ambiente, com pessoas que me façam sentir bem também, ótimo, será lucro. Não menos importante, é Não Ter Medo de Sair da Zona de Conforto. Experimentar, ousar e buscar o novo, sem pensar em continuar onde já estou apenas por conveniência. Ou medo.
Pondo em prática tudo isso, dia após dia, um pouco de cada vez e reiniciando toda vez que dava errado, concretizei dois desejos, tão receosa quanto decididamente. Mas não havia lugar para senões. Transformei um sonho que dera totalmente errado, em oportunidade de estar ao lado de quem, ao longo de mais de seis anos, sempre me quis bem de verdade. Acordei num susto, o relógio não havia despertado. Consultei o céu: tudo escuro ainda. Como poderia, se eu já havia dormido tanto? Olhei pro relógio e descobri o motivo de não ter despertado: 4:00h. Havia apenas duas horas que estava dormindo. Tornei a cair nos braços de Morfeu, certa de que era o melhor a fazer. Um pouco antes do meu horário, ela foi se despedir de mim. Apoiei-me sobre um dos cotovelos pra que me desse um beijo, mas o que se seguiu foi uma sessão de beijos, na testa, bochecha e lábios. Vai com Deus, se cuida, me liga quando sair e assim que chegar lá me liga. Depois de me afogar em seus cabelos úmidos e cheirosos, e percebendo que minha mãe estava preocupada, voltei ao sono. Quando finalmente os raios dourados do Sol vieram me tirar da cama, levantei-me preguiçosamente, rindo da minha ansiedade somada ao medo materno, que agora seriam dois complicadores. Mas ambas sabíamos que, salvo uma força divina, nada me faria desistir. Nem mesmo o namorado, que chegou ao absurdo de me sugerir ficar. Não, querido, há alguns anos eu cometi a besteira de colocar um homem em primeiro lugar. Hoje, em primeiro estou eu, seguida de mim e fechando comigo.
Dez minutos após sair de casa, o telefone tocou. Era ela. rsrs Novamente todas as recomendações maternas. Que ela não me leia, mas eu não saberia viver sem isso. Passei uma semana cruel, de positiva ansiedade, mas negativamente devorando tudo o que via pela frente. Quando chegou o dia, estava tão feliz que esqueci de comer antes de sair. Não fazia mais diferença, o que se abria a minha frente era tão mais importante do que estar de estômago cheio.
Desci no portão de embarque do Aeroporto Internacional Tom Jobim, o eterno Galeão, com duas horas de antecedência do vôo. Uma por exigência da companhia aérea e a outra devido a minha gigantesca vontade de chegar logo, sem risco de me atrasar. Feito o check in, que levou menos de cinco minutos, tinha ainda 1:55 minutos de vida boa, tempo de resolvi aproveitar no melhor estilo carioca de ser: turistando pelo aeroporto. Despachada a mala grande, fiquei apenas com a mochila, que seguiu imperturbável no carrinho. No segundo piso do aeroshopping há diversos quiosques oferecendo toda sorte de lembrancinhas e bibelôs da cidade para os viajantes esquecidos, e chegar em casa sem aquele tradicional “Estive no Rio de Janeiro e lembrei de você” é imperdoável. Como enfrentaria ainda duas horas de viagem e só chegaria ao meu destino no meio da tarde, decidi comer algo pra não desmaiar na melhor parte do dia. Desde o momento da chegada, notei que algumas pessoas tinham pouca ou nenhuma educação. Mas atribuí isso a coincidências da vida. À medida que os esbarrões e caras fechadas foram aumentando, e os hábitos de boa vizinhança foram diminuindo, concluí que, definitivamente, os passageiros mais abastados não tinham um pingo de boa educação. Estava de pé diante do balcão do Rei do Mate, aguardando meu capuccinno, quando um senhor de aparentemente 40 anos, enfiou-se no vão entre mim e o balcão, ignorando-me completamente. Furiosa, lancei-lhe meu protesto “Toda!”, como ele não pediu licença, eu dei assim mesmo, mas foi em vão. Ele não moveu meia ruga da cara feia enquanto passava por mim. Naquele momento a profissional de RH baixou em mim, fiquei imaginando o que aquele pessoal humilde e trabalhador passava ali. Perguntei a um dos atendentes se todos eram mal educados sempre ou era só no carnaval. Ele riu sem graça diante da estranha pergunta e me devolveu a dúvida “A senhora quer sinceridade?”, disse que sim e ele continuou, muito acanhando “É”. Desejei do fundo do coração que aquelas pessoas, todos os funcionários do aeroshopping do GIG pudessem receber ao menos um sorriso cordial como o meu, para que fizesse valer seu dia de trabalho árduo. Telefone tocou novamente. “Tá onde?” hehehe Preocupação a mil por hora. Falei sobre os mal educados e ela tentou me tranqüilizar “eles devem estar apressados pra pegar o avião”.
De lá, segui para uma papelaria, minha perdição. Tentando decidir qual caneta levar pra minha coleção, achei uma que serviria para anotar os belíssimos textos da minha “amiga imaginária”. Mais adiante, um pequeno cartão de parabéns pelo aniversário que fora na semana passada. Na frente do cartão, um gato e um cachorro: Garfield e Oddie, amigos inseparáveis, moreno e branco, gordo e magro, malvado e bondoso, eu e ela.
Ainda possuída pelo espírito RH, tornei a perguntar pra atendente da papelaria se os passageiros costumavam ser grosseiros, no que ela mais que prontamente me respondeu: “O quê? Tem gente que falta pouco dar na minha cara!”. Percebi que esse era um grito preso na garganta e parei para ouvi-la, deixei que pusesse pra fora a raiva de dar seu melhor e receber o pior. “Os espanhóis são os piores: param e perguntam onde é o banheiro, se eu dou ‘boa tarde’ antes de responder, eles dizem ‘eu só quero saber onde é o banheiro’ e a vontade é mandar se virar!”. Engatamos um papo divertido, sobre o local onde morávamos, pra onde eu estava indo e por fim, quando minha hora se aproximou, nos despedimos como se fôssemos velhas amigas de colégio. Cheguei ao portão de embarque e liguei “Mãe, to indo”. Outra sessão de recomendações, e ela perguntou “Tá com medo?”. Nós estamos, né? “Um pouco”.
Quando adentrei o corredor que me levaria ao avião, a pulsação acelerou, mas não havia jeito de desistir. Não pude deixar de notar que o comissário que recebia os passageiros, dava-lhes um simpático e mecânico “boa tarde”, som um sorriso velado. Decidi que eu queria mais que o seu profissionalismo, queria sua verdadeira simpatia e prazer em servir. Lancei-lhe meu sorriso, deixei-o ver o quanto estava feliz por estar ali e agradecida por ser bem recebida por ele, que me devolveu um genuíno sorriso, aberto e franco, e um “seja bem-vinda”.
Sentei-me de cara pra janela, a fim de acompanhar todo o movimento lá fora. Fotos e mais fotos, a fim de tirar o foco do meu nervosismo. A sensação a bordo é de estar num enorme ônibus de viagem. Após todas as instruções de segurança, as quais eu estava totalmente alheia, a voz grave do piloto soou na aeronave, em português e inglês, avisando sobre nossa partida. Durante quase cinco minutos o avião taxiou, rumo à pista de decolagem. Estava já me acalmando, certa de que seria de fato como estar num ônibus. O assento sobre a turbina da direita, me permitiu sentir o impulso provocado por elas quando o piloto anunciou “Atenção tripulação, procedimentos de decolagem”. Em segundos, a pressão aumentou, as imagens fora da janela começaram a passar em velocidade alarmante e logo eu me senti flutuar. Estávamos subindo! Vi a cidade diminuir gradativamente sob meus pés. Despedi-me silenciosamente do Cristo Redentor, certa de que o Verdadeiro estaria comigo nesta aventura.
Em minutos, estávamos a 840 km/h num céu fabuloso, azul salpicado de nuvens brancas. O jato 737-800 cruzava as terras brasileiras mais bonitas que já vi. Tanto verde aqui e tanta miséria por aí, pensei com meus botões. Algum tempo depois, nos serviram um belo lanche, com o suco Mais que eu tanto amo. Li bastante, pra distrair a mente e aplacar a vontade de dar um ataque de pânico. Lembrei do ator André Gonçalves e me imaginei surtando a milhares de quilômetros de casa e do chão. Pensei até mesmo em, discretamente, pedir um calmante ao comissário, mas não daria pra ser discreta, pois do meu lado, atrapalhando e ouvindo, havia um senhor. E, sem chance, eu não declararia o meu pavor a um estranho, não mesmo. Então só me restou a leitura das vinte mil revistas e jornais que levei. Quando levantei os olhos, vi uma civilização lá embaixo e fiquei imaginando qual cidade seria. Fiquei pasma ao descobrir que já era o meu destino. Quanto tempo havia se passado? Apenas uma hora e meia. Uma pequena turbulência nos recepcionou. Com a fantástica experiência de voar por entre as nuvens, percebi que dentro delas, havia raios. Sim, raios! A descida, após essa maluquice, parecia que aconteceria a qualquer momento, em qualquer lugar. O avião descia, descia e eu não via pista ou sinal dela. A turbina ao meu lado parou. Parou! Novamente o pânico. Pensei: será que todo mundo sabe que sou doadora de órgãos? Será que sabem que tudo que é meu fica pra minha mãe e meu sobrinho? Dá tempo de escrever? Enquanto ia arquitetando meu plano, senti o solavanco e a pressão nos ouvidos de novo. Estava em terra firme outra vez. Brasília é a cidade capital do Distrito Federal, capital do país. Não me parecia estar tão longe de casa assim, o céu era bem azul, o dia quente, as pessoas, bem, as pessoas pareciam ser normais. Levei uns bons minutos andando do avião até o desembarque, o aeroporto é grande também. Fui buscar a mala ainda zonza da viagem e com uma forte dor de estômago, revirado pela altitude. Mesmo sem óculos e de longe, a vi. Fernanda, tão baixinha quanto eu imaginava e muito mais bonita. Cruzei a passagem de desembarque e fui recebida com um longo e fraterno abraço, aquele em que tantos momentos da vida eu desejara ter, o que sempre tivera virtualmente. Agora ele era real, tão real quanto as lágrimas que deixamos escorrer, de saudade, de amor, de vitória. Fechamos a passagem enquanto tudo isso acontecia em segundos de uma eternidade.
No comitê de recepção, vieram ainda Kankakee, Patrícia e o lindíssimo Isaac. De lá rumamos para o lugar onde tudo acontece nesse país: a Esplanada dos Ministérios. No caminho, ela foi me contando tudo sobre a história da cidade. Asa Sul e Asa Norte são regiões da cidade, que assim são chamadas por ter sido Brasília, construída no formato de um avião. Paramos na Catedral de Santo Antônio, que eu, a única católica do grupo, fiquei enlouquecida ao ver. Quanto mais entrava, mais me sentia bem. Tudo ali me fazia sentir bem. Estava mais do que feliz, estava radiante com tudo. E não podia sair dali sem fazer algo. Sentei-me aos pés do Cristo e, em meio a lágrimas, agradeci por tudo aquilo, por ter conseguido, pela vida da minha amiga e todos os seres viventes daquele lugar. Não conseguirei reproduzir fielmente tudo o que senti e vivi. Mas tentarei. Fizemos uma rápida parada em frente ao prédio da regional da minha empresa, da qual carrego um grande orgulho de fazer parte. Uma pena não ter ninguém por lá, afinal, era carnaval pra todos. Mas fica aqui meu abraço para Maristela e Kátia, brasilienses da equipe Delta no Brasil. A Esplanada é igual ao que se vê na TV. Esqueci de tirar fotos, aliás, a empolgação era tamanha, que nem me lembrei disso. O Congresso Nacional, o Itamaraty e o Palácio do Planalto. Tudo igualzinho. Muito bonitas as construções, e concluí que, sem medo de errar, Oscar Niemeyer é o maior gênio da arquitetura mundial. As mansões ao longo da cidade também são lindas e leves, cercadas de verde por todos os lados. E completa a paisagem urbana local, a falta de poluição visual e sonora. Impossível não notar a limpeza, especialmente quando se vem de uma cidade como a minha, onde as ruas são enfeitadas de toda a sorte de sujeira. A noite nos seguiu pelo caminho, e chegamos a Cidade Ocidental juntos. Com Isaac no colo, entrei na casinha de boneca dela. Se eu já não soubesse que ela é bagunceira, diria que é uma moça prendada e organizada, pois a casa estava confortavelmente arrumada e cheirosa. Senti-me tão bem, tão querida, aquilo tudo havia sido feito pra mim, pensando na minha chegada. Depois do banho – que me ajudou a recobrar 40% da energia – fomos ao mercado e depois, ao fogão. Eu fiz o delicioso macarrão de atum, mas a bonita não come isso, nem aquilo e nem aquilo outro. Sabia que era fresca! Perdeu. O dia seguinte começou com uma forte dor nas costas, fruto da tensão do dia anterior. Um dorflex resolveu boa parte do problema. E já na mesa do café, conversamos sobre tantas coisas ocultas até de nós mesmas, sabendo que pra nós não há vergonha ou segredo. Batemos perna pela cidade, conheci a sogra dela e o cunhado. Aliás, Marcell é um rapaz muito bonito, cujo meu palpite é que consiga encontrar a paz quando a mulher certa o derrubar desse cavalo selvagem que ele monta. Conheci Marcelo, o irmão dela, um menino muito bonito, na complicada fase adolescente.
Fomos ao bosque, lugar muito tranqüilo, apesar de cheio de gente. E limpo. Pensei: eu poderia viver num lugar assim. E com a Fê do lado, tudo estaria sempre bem. Tomei uns trinta sorvetes, incluindo sacolé, que por aquelas bandas se chama din din. Hehehe O melhor mesmo é que o danado custa só R$0,25. O clima extremamente seco e sol forte me fizeram pedir líquido desesperadamente. Nunca tomei tanto sorvete na vida. O tempo fechou, fez frio até, mas lá fomos nós rumo ao Saia Velha, apelido “carinhoso” do Clube Águas Correntes. Meu humor estava no pé, como sempre acontece em dias nublados. Mas quando o sol saiu... Não teve água gelada e nem medo que fizessem aquela menina sentir pena de mim e me poupar de embarcar nas aventuras aquáticas dela. Sendo assim, após o banho de mini-cachoeira geladérrimo, que fez doer até os ossos, fomos as três, eu, ela e Raskamí, ao toboágua de trocentos metros de altura. A queda foi linda. Senti-me uma jaca madura indo ao chão e se esparramando pelos cantos. Quando consegui levantar, só sabia rir. Tudo misturado: a dor e a graça da situação. Não satisfeitas, fomos ao outro, com mais curvas e individual. Caindo naquele escorrega de água, queria parar, queria que a água secasse e eu pudesse me ajeitar. Tipo: pára agora! Mas o máximo que consegui foi uma forte dor no cotovelo ao tentar me sentar. Na saída do canal, só uma gargalhada profunda. Depois de alguns minutinhos de Sol muito forte, o suficiente pra preferir ficar na água, fomos até as cachoeiras. Lugar mágico, contato com a natureza, paz, vida renovada. As mãos oleosas do bronzeador me impediram de subir ou andar o mais que gostaria nas pedras. Uma queda naquelas pedras afiadas seria fatal e eu estava longe demais pra me dar ao luxo de me machucar. Mesmo assim, conseguimos boas fotos e momentos inesquecíveis. Durante o caminho de volta vim pensando em quando poderia viver aquilo tudo de novo... Depois de ver um filme mega ruim, chegou a hora em que tudo começa a virar saudade. Acordamos cedo pra nosso último passeio, pois dali a algumas horas eu estaria no vôo que em traria de volta a casa. Finalmente consegui conhecer Dona Neide, que foi conosco ao passeio derradeiro e me fez lembrar da minha mãe, pois ambas fazem parte daquele seleto grupo de mulheres fortes que nunca perdem a fé. Lá do alto, o Lago Paranoá é quase tão bonito quanto de perto. Quando soube que iria a Brasília, logo me surgiu o Lago na cabeça. Eu não sabia por que, mas sabia que tinha de conhecê-lo. Nem mesmo quando estava lá eu me lembrava do motivo que me fazia querer estar ali. Somente quando voltei pra casa, consegui lembrar. Há muitos e muitos anos atrás, quando era uma menina, ouvia um disco de Oswaldo Montenegro, ilustre cantor brasiliense, onde havia a música “Pra longe do Paranoá”. É uma música que não me dizia muita coisa, a não ser o fato de ser cantada muito rápida e eu, desafiada, tentava a todo custo acompanhar. “Numa tarde quente fui-me embora de Brasília num submarino no Lago Paranoá”. O Lago é artificial, foi construído juntamente com a cidade para amenizar a secura local, aumentando a umidade relativa do ar. E como todo projeto do Governo, havia quem duvidasse de sua efetividade. Os anos deram a resposta. Quando finalmente chegou o momento da despedida, eu queria apenas mais umas horinhas pra ficar. Tinha tanta coisa pra gente viver ainda... Então só me restou abraçá-la com força, querendo eternizar aquele momento, sabendo que daquele dia em diante, nada mais seria como antes. Entrei no portão de embarque com um nó na garganta que eu não sabia o motivo. Girei nos calcanhares para vê-la ainda uma última vez e acenei. Quando me virei, as lágrimas cascatearam quentes pelo rosto, derrubando de vez a minha certeza sobre a vida. Não deveria estar chorando, não tinha motivo, estava voltando pra casa. Somente quando cruzei o túnel que me levaria ao avião, olhei para os lados de onde ainda podia ver a cidade e pensei: será que a Fê já foi embora? E aí me dei conta de que já estava sentindo uma imensa saudade da minha amiga e de tudo de bom que ela me dera naquele curto e maravilhoso período. Á você, branca do meu coração, mais uma vez, obrigada por tudo. Obrigada por estar por perto mesmo de longe, por me aturar, por me aceitar e por torcer por mim. Amo você demais e agora, muito mais e pra sempre. *-*
Fechando o carnaval, salgadinho na casa da Dona Vilma. Ô coisa boa! Domingo maravilhoso, mesmo com a dorzinha no fim. Com tanto carinho, acabo ficando mal acostumada.
(Obs.: esqueci de finalizar o post. rsrs)
L.

Um comentário:

Fernanda Azevedo disse...

Eu é que devo agradecimentos, por tudo em que você me ajudou e ainda ajuda. Eu sou uma fruta nova e você me ajuda a amadurecer! Eu nem sei dizer que "diacho" de sentimento é este que dedico tão fortemente à você. A sua vinda reafirmou a minha vontade de eternizar, de levar para o céu a doçura da sua amizade.
Eu te amo demais, Lucille!

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