segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Perdida ou em perdição?

Estava relendo os textos antigos. Voltei a abril de 2008, quando tudo começou...

A noite deveria ser de amor. Era véspera do aniversário de alguém querido, ou pelo menos deveria ser querido. Mas apesar de toda a conversa, ele preferiu estar só, com filha e pais. Sozinho, não. Apenas sem mim. Comi um x-tudo, liguei pra amiga, queria não chorar mais. Já tinha chorado o suficiente aquela noite. Queria estar com ele, dizer-lhe "feliz aniversário, meu amor", mas não havia amor que chegasse para obrigá-lo a me querer do lado, ele havia escolhido com quem queria passar a data e eu estava fora da lista de convidados. Ergui o queixo, fui-me embora e deixei que o poder divino me guiasse. A noite deveria ser de amor, mas estava sendo de risos entre amigos, dança e suor. Por alguns momentos a mágoa deu lugar a satisfação por estar ali. Eu estava ao lado de quem me queria de fato. Olhei pro lado, lá estava ele. Era alto, negro, forte e muito sério. Comentei com a amiga e em segundos ela voltou trazendo a novidade: ele quer você. O melhor de tudo não foi a querência, mas sim, a surpresa dele. Ela? Tem certeza? Não... Ela? Sim, eu mesma. Será que é tão impossível assim? Parece mesmo que eu nunca estou disponível? Pois é, não era pra estar, mas... Estava! O dia seguinte começou a nascer, e sob os raios dourados, eu me aprumava sobre a ponta dos pés ao deixar que aqueles braços fortes e decididos me envolvessem no mais apertado abraço, enquanto os lábios suavemente encobriam os meus. O sorriso tímido, a voz grossa, a pele macia. Ele era perfeitamente normal em suas imperfeições. Estar no mesmo círculo de amigos facilitou nossa vida, fomos corajosamente convencidos de que era a melhor coisa a fazer. E foi. As palavras eram necessárias, mas o pouco tempo nos impediu de proferir todas. Sabíamos apenas de uma coisa: muito tínhamos em comum, muito mais do que apenas o desejo de querer repetir a dose. E assim, a noite foi como deveria: de amor.

As semanas que se seguiram ao nosso primeiro contato foram complicadas. A vontade de estar com ele era absurda. Mas nem sempre podia estar lá. Ele me fazia bem e em tudo combinávamos: escolhemos a mesma carreira, a mesma faculdade, gostávamos da mesma música, tínhamos os mesmos amigos e gostávamos muito da companhia um do outro. Eu queria passar a vida discutindo Recursos Humanos com ele, lendo artigos, revistas, ensinando, aprendendo, trocando. Queria ver fotos, ouvir CDs, ver TV. De abril a junho essa foi nossa vida secreta. Não tão secreta assim, afinal, ele estava solteiro e eu, bem, eu não tinha a quem dar satisfação. Ele me buscava, me levava, exatamente como um rapaz sério deve fazer. Ele me segurava pela mão, como um rapaz respeitador deve fazer. Ele me tirava o fôlego com um beijo, como um rapaz safado deve fazer. Gostava da proteção que ele me oferecia sem nada pedir em troca. Adorava ficar na pontinha dos pés pra alcançar-lhe os lábios ou ganhar um doce abraço, que me circundava todo o tronco. Mas o que eu amava mesmo, era ouvi-lo dizer, entre risos e beijos "você é demais, cara".

Ele era o porto seguro da minha embarcação, que estava à deriva nesse confuso oceano de sentimentos. Com ele reaprendi a ser a menina levada, solta nas ruas. Com ele reabri o sorriso puro e farto de quem se orgulha de ser como é. Com ele tive novamente vinte anos, cheia de ar puro no peito e nenhum talvez no coração. Com ele conheci o maior estádio de futebol do mundo.

Naquele dia, nosso primeiro passeio juntos, eu tinha ainda um receio do perigo do lugar. Quando explodiu o primeiro gol, entendi que ele jamais deixaria me acontecer nada. Multidões pulavam e gritavam ao nosso redor e eu, assustada com tamanha euforia, fui prontamente cercada por um par de braços musculosos, cujo dono achou de comemorar o gol do próprio time, protegendo uma torcedora do time adversário. Quando acabou, pensei: serei despachada no primeiro ônibus. Mas ainda tive o prazer de fazer a viagem de volta a Piedade com uma deliciosa conversa, conhecendo-o mais, aprendendo mais sobre aquele ser que me tornava alegre outra vez.

Nossas tardes eram as mais deliciosas dos últimos anos. O bairro da Piedade foi uma boa surpresa da Zona Norte. Conheci pessoas, ruas e casas. A estação de trem, que já fora palco de uma cena de briga, se tornou o local de descobertas e cenário de uma bonita história de reis. O Rei da Mauritânia e a Rainha de Zamunda, unindo seus povos, semeando amor, construindo a paz dos deuses.

Nossos filmes eram os mais divertidos, mesmo os que não tinham graça. Nossas pizzas e pipocas eram banquetes. Nosso silêncio era o mais suave. Nossos sons, os mais prazerosos.

Um dia, passeando pelo shopping, ele me parou e, cabeça baixa, olhos serenos, me disse: "acho que eu tô me apaixonando por você". E eu, covarde, não reagi. Não disse e não ousei sentir o mesmo. Entre nosso querer e poder havia um amor moribundo, aguardando o despacho final. E eu não tinha coragem suficiente de desligar os aparelhos que o mantinham vivo. Fiquei com aquela frase na cabeça durante todo o passeio.

Apesar da enorme burrice e igual covardia, sabia que poderia sempre contar com aquela amizade bonita e desapegada. Certo dia estava no meio da Suburbana, tarde de uma noite fria, perdida e extremamente amedrontada. Liguei e ele disse, de dentro de uma festa "vai lá pra casa". Mesmo conhecendo o caminho que tantas vezes tinha feito pra ir ao encontro dele, não sabia como chegar lá estando abalada daquela forma. E ele sempre tinha solução pra tudo: desde os números de ônibus, até pagar o táxi quando eu chegasse lá. Não foi preciso no fim das contas. O medo me assaltou de vez e eu voltei ao ponto de partida. Infelizmente. Tempos depois, novamente um pedido de socorro e ele estava ao meu dispor, solícito e amigo. "Vem pra cá" e eu fui, de bom grado e agradecida por não haver mágoa nele e por saber que haveria ali um amigo e protetor. Chovia demais, muitos relâmpagos e trovões. Travei a minha batalha interna: ficar ou lutar? Vesti-me com o short jeans, a novinha bata branca e o tênis branco. Nada havia que acontecer, apenas o colo que eu precisava naquele momento. Dormi sozinha, pois ele foi sair com os amigos e quando a madrugada subiu, senti seu calor do meu lado. E tudo ficou em paz outra vez. De manhã, e como todas as outras vezes, ele acordou primeiro e ficou me vendo dormir. Estranho e bonito, saber que alguém desperta de seu sono apenas pra me olhar enquanto durmo. No dia seguinte, eu tinha uma missão. Era dia de eleição eu deveria buscar o celular. Ele foi comigo até a entrada da caverna do dragão, de lá seguiu viagem e eu fui só, como disse que precisava ir. Cheia de recomendações dele, gravei apenas a última: assim que sair de lá, me liga. Quando saí percebi que estava sendo seguida e desejei do fundo do coração que nada de ruim acontecesse mais uma vez. Fixei o pensamento nele e disse a mim mesma que não era hora de bancar a garotinha-medrosa-fugindo-do-bicho-papão. Liguei pra ele e avisei que estava indo embora, mas não mencionei o fato. Ele certamente me mandaria ir pra casa dele novamente. Eu voltaria com total prazer, mas sabia que poderia ser seguida até lá e, enfim, mudei de ponto de ônibus estrategicamente e sai da zona de perigo. Exatamente como eu previ, não fui seguida, pois tudo dava a entender que iria pra casa. E quando finalmente cheguei, avisei-o do que havia acontecido e a resposta foi a que eu já sabia "você tem que parar com isso". Sim, meu bem, eu deveria não ter nem começado, mas já era tarde demais.

Eu sabia que deveria ter sido menos medrosa e mais ousada. Sabia que deveria ter paciência. Sabia que o que outrora me fizera feliz não se comparava ao que havia por fazer. Sabia de muita coisa, mas não tive a coragem necessária para transformar essa pequena história em uma fantasia multicolorida. Fui realista demais, criteriosa demais, dura demais e deixei que o príncipe fosse embora pensando que, ao invés de Bela Adormecida, eu gostava mesmo de ser a Malévola.

Hoje, nossas bocas que não produzem mais som, deixam que nossos olhos cruzem-se nos caminhos escuros por onde andamos. Há uma quase palpável vontade de correr pra jogar de peito aberto no mar azul dos jovens enamorados pela vida. Dançar com ele era uma das delícias de sábado a noite, vendo e ouvindo-o desejar e elogiar-me. E eu querendo-o igualmente. Sabendo que, alheia ao arrastão de olhares que eu trazia, era o dele que mais me interessava prender. E feliz quando ele dizia "eu perco pra tu..." rsrsrs Claro que perdia, meu amor. Perdia porque eu não pedia, eu roubava na mão grande mesmo. Sua atenção, que era o que mais me importava.

E agora, como que adivinhando meus pensamentos, ele volta a me visitar virtualmente. Gostaria de ter coragem de dizer-lhe o quanto sinto sua falta, o quanto me irrita vê-lo a tão curta distância e ao mesmo tempo tão longe do meu coração. Queria poder ganhar aquele abraço apertado novamente e ficar ali sem dizer nada, nem ouvir nada, apenas sentindo o calor do peito que me acolhe e da mão que acaricia minhas costas. Queria tanta coisa... NA: Escrito em 24 de janeiro de 2009.

Rio de Janeiro, 25 de janeiro de 2009.

Queria poder ganhar aquele abraço apertado novamente e ficar ali sem dizer nada, nem ouvir nada, apenas sentindo o calor do peito que me acolhe e da mão que acaricia minhas costas.

Assim eu quis e assim aconteceu. Ganhei tudo o que queria e mais um pouco. Ouvi-lo dizer que sentiu minha falta, tirou-me os pés do chão, elevou-me a décima oitava potência. Dessa vez não tive medo de retribuir tudo, em quantidade e qualidade. Fomos dois animais selvagens, em delicioso embate, embrenhados numa selva musical, cheia de olhares curiosos, ouvidos ansiosos e corações invejosos. Ali, éramos um do outro e mais ninguém se atreveria a dizer o contrário.

Se haverá amanhã?

Se eu acordar, saberei que sim.

L.

3 comentários:

Dr. Tony Tupac Monteiro disse...

Isso se chama paixão... Ou será, como dizem... amor?

Sei lá, defina!

Fernanda disse...

rsrsrs
Ele é especial, mesmo, não é?
Cuida desse coração aí, minha irmã.

Loo Carbel disse...

Piedade, os homens da piedade... Olha, eles são problemáticos Lu, piedade e abolição aliás são lugares problemáticos. Texto lindo... Pra alguem que.. Merece? Vai saber, mas o que vale é o sentimento, e esse daí de longe da pra ver que é sincero.

Como naquela foto que você postou no orkut: "É assim que eu queria." Mas.. Será ?

Só sei que te amo, pra sempre ! =)

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